A CRÔNICA DO FRACASSO ORQUESTRADO ("O fracasso é a ferramenta que a vida usa para nos transformar em filósofos." — Alexandre Chachian)
Há dias em que o aroma do café na sala dos professores não é suficiente para mascarar o cheiro acre da frustração. Naquela manhã de segunda-feira, enquanto folheava distraidamente meu plano de aula, percebi que algo estava diferente. O burburinho habitual dos colegas havia sido substituído por um silêncio pesado, carregado de tensão.
Foi quando vi Marijane, nossa coordenadora pedagógica, entrar na sala com uma pilha de pastas coloridas debaixo do braço. Seu sorriso, que em outros tempos poderia parecer acolhedor, agora me causava um mal-estar inexplicável. "Bom dia, pessoal! Tenho aqui os resultados das avaliações dos alunos sobre o desempenho dos professores", anunciou ela, com um entusiasmo que soava artificial aos meus ouvidos.
Observei os rostos dos meus colegas. Alguns empalideceram, outros trocaram olhares de resignação. Era como se estivéssemos prestes a receber sentenças de um tribunal invisível. E, de certa forma, era exatamente isso que estava acontecendo.
À medida que Marijane distribuía as pastas, eu refletia sobre como chegamos a esse ponto. Quando foi que a relação entre professores e coordenação se tornou tão adversarial? Em que momento as avaliações, que deveriam ser ferramentas de aprimoramento, se transformaram em armas de controle e manipulação?
Folheei minha pasta, repleta de gráficos coloridos e comentários dos alunos. "Professor muito rígido", dizia um. "Aulas monótonas", reclamava outro e blá blá blá. Cada palavra era como uma pequena facada em meu amor pela profissão. Mas o que mais me incomodava não eram as críticas em si, e sim a sensação de que todo esse processo servia apenas para justificar o "sucesso" da coordenação às custas do nosso suposto "fracasso".
Lembrei-me das inúmeras vezes em que pedi apoio para lidar com turmas difíceis, ou recursos para tornar as aulas mais dinâmicas. As respostas sempre foram evasivas, acompanhadas de sorrisos condescendentes e promessas vazias. Agora, ali estavam os resultados dessa negligência, meticulosamente documentados e arquivados, prontos para serem usados contra nós a qualquer momento.
Olhei ao redor e vi nos olhos dos meus colegas o mesmo desalento que eu sentia. Éramos nós, na linha de frente, lutando diariamente para fazer a diferença na vida dos alunos, enquanto a coordenação se gabava de "resultados" obtidos à custa de nosso desgaste emocional e profissional.
Naquele instante, tomei uma decisão. Levantei-me e, com a voz trêmula mas determinada, disse: "Colegas, precisamos conversar. Não podemos continuar aceitando que nosso esforço seja transformado em estatísticas frias e relatórios tendenciosos. Estamos aqui pelos alunos, não por gráficos ou avaliações enviesadas."
O silêncio que se seguiu foi quebrado por murmúrios de concordância. Vi um brilho de esperança nos olhos dos meus companheiros. Talvez, finalmente, estivéssemos prontos para lutar por uma mudança real.
Saí da sala dos professores naquele dia com um misto de apreensão e determinação. O caminho à frente seria difícil, mas eu sabia que não estava sozinho. O verdadeiro fracasso, percebi, não estava em nossas supostas falhas como educadores, mas em permitir que um sistema distorcido nos definisse.
A você, caro leitor, deixo uma reflexão: em sua jornada, seja ela qual for, não permita que outros transformem seus desafios em armas contra você. O verdadeiro sucesso não está em relatórios ou avaliações, mas no impacto positivo que causamos na vida daqueles que cruzam nosso caminho. E isso, nenhum gráfico colorido jamais poderá medir.
Questões Discursivas:
1. O texto narra a experiência de um professor diante da avaliação negativa de seus alunos. A partir dessa experiência, discorra sobre os desafios da avaliação docente e a importância de se considerar diferentes perspectivas para uma avaliação mais justa e eficaz.
2. O autor critica a utilização das avaliações como instrumentos de controle e manipulação por parte da coordenação pedagógica. Analise como essa prática se relaciona com os conceitos de poder e dominação na escola, e quais os impactos negativos que essa lógica pode gerar no ambiente escolar.