"Em defesa de Eugênio"
Eu tentei entender o homem pela mente de uma mulher, tentei não dar importância às sutilezas sentimentais, ignorei amores e vesti a vigarice deslavada, conclusão: “cai do cavalo”, para não dizer do “Asno”.
Não quero pensar como Inês Pereira, personagem de Gil Vicente que sabiamente disse: “Mais vale asno que me leve que cavalo que me derrube”, porém nem sempre consigo permanecer a galope.
E é pensando como mulher, mais propriamente como Clarinha, que resolvi comparecer em defesa de Eugênio, o canalha.
Eugênio, como todo policial e ex-jardineiro, tem cheiro de homem, exala masculinidade e por onde passa atrai não só olhares, mas o próprio cio das vadias e senhoritas sedentas. O que impressiona é a capacidade de Eugênio dar conta de todas. Impressiona, mas não aguça a minha curiosidade, pois creio que os homens devam ser apreciados, estudados e depois “literalmente” laçados, e porque não dizer “enfeitiçados”?
É neste meu preceito que afirmo ser Eugênio dono de um autocontrole invejável, pois “trepa” (faz amor, transa, afoga o ganso –acho nojento isso) como um animal, não lida com os sentimentos de forma direta; quando percebe que a atração ultrapassou seus limites, simplesmente some, refugia-se em sua própria solidão.
Quando Eugênio conheceu Clarinha, a filha do poderoso Samir, tinha a mente de um menino, pensava nos olhos ao invés da bunda; pensava nos lábios ao invés dos seios; pensava no beijo ao invés do orgasmo. Enfim, Eugênio era um romântico. Era, pois a vida mostrou a Eugênio uma realidade totalmente contrária às fantasias e finais felizes.
Depois de saciar Clarinha e iniciá-la sexualmente, Eugênio viu-se obrigado a cair no mundo, não poderia carregar consigo a inocência de uma jovem e o vício de ser “canalha”.
Viveu parcialmente sozinho, até encontrar Adriana, sua ex – futura – esposa. Formado, mais ordinário do que antes e totalmente avesso ao romantismo casou-se com o intento de amenizar sua impulsiva aptidão sexual; enganou-se novamente, sabemos muito bem qual é o fim de todo canalha compulsivo: o divórcio!
E então meu personagem Eugênio resolveu escrever suas memórias, com o único intento de contabilizar o quão popular continua sendo; mas para sua surpresa o clã feminino demonstrou avidamente a aversão por canalhas sensacionalistas.
Admito que o vadio é um pouco arrogante e “metido”, mas devo enfatizar que sabe perfeitamente conduzir uma mulher à loucura – e às vezes é somente disto que precisamos: condução -, o que seria um desperdício jogarmos Eugênio no esquecimento, se for só para o prazer, que seja Eugênio, o canalha das entrelinhas.
Eu costumo dizer que nada deve ser desprezado, mesmo que esse nada seja um Eugênio, ou traduzindo: não devemos desprezar àquilo que nos seduz.
Eugênio é personagem de três contos publicados no Recanto das letras, cujo título é "Eugênio e Clara"