Entre Sem Bater - A Mulher Oca

Oscar Wilde disse:

"... só há uma coisa pior do que perder a mulher que se ama. É ganhá-la - e descobrir que ela é oca ..."(1)

Certamente, as frases de Oscar Wilde suscitam más interpretações(2), sobretudo em tempos de redes sociais rasteiras e superficiais. Analogamente, o que pode ser uma ironia ou metáfora atual, ajusta-se para o mundo em que Wilde vivia, e vice-versa. Por outro lado, atualmente, frases e atitudes de personagens reais, com endereço certo a um público pouco atento é uma realidade. Surpreendentemente, muitas frases ganham uma significação elevadíssima, com o advento das redes sociais dos estultos.

A MULHER OCA

AVISO - DISCLAIMER

Este texto é uma visão exatamente de acordo com a proposta da trilha "Entre Sem Bater". Leitores que avaliam e tiram conclusões pelo nome do autor da frase ou pelo título devem ter cuidado na leitura. Desse modo, fica o aviso de que não se deve ler este texto se o preconceito e a pessoa é, por exemplo, uma mulher oca.

PENSADORES HOSTIS

Existem dezenas de pensadores, humoristas, e até mesmo filósofos, com reconhecimento global, que são hostis às mulheres. Nélson Rodrigues, Picasso, Nietzsche, Ambrose Bierce e tantos outros são mordazes. Entretanto, Oscar Wilde ganha quando se refere à mulher oca ou não, chega a ser cruel. É provável que seja factível escrever um livro com 13 capítulos sobre as frases de Wilde e as mulheres. Cada capítulo pode ser o desenvolvimento de cada uma das frases, nenhuma que seja elogiosa nas entrelinhas.

Desse modo, escrevo somente sobre uma destas frases, mas é possível fazer crônicas sobre muitas outras, transpondo para estes tempos modernos. As conquistas das mulheres de valor estão beneficiando, com toda a certeza, aquela mulher oca, que se acha o máximo. E nem é preciso, atualmente, ganhar estas mulheres, para descobrir o engano(3).

ENGANO CRUEL

A frase de Wilde, certamente repleta de ironia e crítica, aludia à superficialidade e à hipocrisia dos certos círculos sociais de sua época. Contudo, se Wilde estivesse vivo hoje, é provável que ele veria sua observação com elevação exponencial nas redes sociais. Vamos ser sinceros, as redes sociais apresentam mais superficialidade, hipocrisia e vazio do que anteriormente, é fato!

No cenário atual, plataformas como Instagram, Facebook e Tik Tok se tornaram vitrines de vidas com edições cuidadosas e falsas. Fotos passam por uma infinidade de filtros e ajustes antes de sua publicação, transformando a realidade em uma ilusão de perfeição. Perfis surgem com um esmero inacreditável, com cada post ou comentário projetando meticulosamente uma imagem ideal.

O objetivo? Criar uma narrativa de vida para atrair seguidores e uma validação efêmera. No entanto, quando tomamos, ipsis litteris, o pensamento de Wilde, a coisa fica muito pior.

O que faz com que uma pessoa, conhecendo, por exemplo, a mulher oca que ele descobriu anteriormente, continue na hipocrisia?

SOCIEDADE PODRE

Wilde, um crítico perspicaz da sociedade vitoriana, teria fascinação e talvez horror ao ver como tudo se intensificou com a era digital. A "mulher oca" que ele mencionava agora encontra seu equivalente nos perfis digitais vazios de substância. As redes sociais proporcionam um palco onde todos podem exibir suas melhores versões, frequentemente sem nenhuma autenticidade.

A obsessão por aceitação social se reflete nos incontáveis selfies, nas postagens irreais e nas vidas através de uma lente sem nenhum foco.

E não pensem que este comportamento está nos limites das redes sociais. Analogamente à teoria de que "... a vida imita a arte .." temos, em nossa sociedade podre, perfis reais imitando perfis do mundo digital.

Por trás dessas imagens perfeitas em épocas diferentes, encontramos a mesma equidade que Wilde criticava. A busca incessante por aprovação externa pode levar a uma desconexão com a própria identidade. A pressão pela aceitação, mesmo hipócrita, resulta em uma vida para os outros, ao invés de para si mesmo.

Nesse processo, sem dúvida, a essência, a profundidade, os valores e experiências pessoais somem, em favor de uma fachada ilusória.

Além disso, essa cultura da imagem tem implicações psicológicas profundas. Estudos(*) mostram que a comparação constante com os perfis idealizados dos outros pode levar a sentimentos de inadequação, ansiedade e depressão. A felicidade aparente dos outros, exibida nas redes sociais, pode criar uma ilusão de que todos, exceto nós mesmos, estão vivendo vidas plenas e felizes. Isso reforça a superficialidade, incentivando a construção de identidades que são tudo menos autênticas.

CRÍTICA MORDAZ

Wilde, com sua crítica mordaz, provavelmente veria nas redes sociais aquilo que ele já denunciava: a valorização do superficial sobre o substancial. A tecnologia moderna não criou essa tendência, mas a amplificou e a tornou global. A "mulher oca" de Wilde não é uma figura literal. É, com toda a certeza, uma metáfora de qualquer pessoa que valoriza mais a aparência externa do que o conteúdo.

Por outro lado, é importante ressaltar que esta superficialidade e falta de conteúdo da mulher oca não é prerrogativa do gênero feminino. Contudo, é assustador o crescimento destes comportamentos nas mulheres, o que muitos antropólogos explicam.

No entanto, é importante lembrar que nem todas sucumbem a essas armadilhas modernas. Muitas usam as redes sociais de maneira autêntica, compartilhando experiências reais e promovendo causas significativas. Desta forma, elas tentam construir comunidades e grupos a partir de interesses e valores comuns, o que apresenta muitas limitações.

MUNDO MODERNO

A mesma tecnologia que pode promover a superficialidade deveria ser uma ferramenta poderosa para conexão genuína e autêntica. A diferença está em como a usamos e no propósito por trás de nossas ações online. E seja a mulher oca, que descobrimos tardiamente ou que não queremos contrariar, sujeita-se a seguir "o enterro".

Portanto, a observação de Oscar Wilde sobre a "mulher oca" revela-se assustadoramente atual no contexto das redes sociais. Em um mundo onde a aparência frequentemente vale mais do que a substância, a crítica de Wilde é uma verdade inquestionável.

O pensamento de Wilde serve como um alerta: que, ao buscar reconhecimento e validação, não nos tornemos ocos. Devemos, outrossim, valorizar a verdadeira essência de quem somos e do que os outros são sem se preocupar com as aparências.

Pode parecer que esta crônica, com esta frase, é algo provocativo e non sense. Contudo, se algum debate existir, cada pessoa poderá aproveitar esta data (dia da "Reflexão Privada" e pensar sobre a ausência de conteúdo. Mas, pior do que a ausência de conteúdo é ter a estupidez(4) de adorar conteúdos negacionista ou dos déspotas de púlpito.

Em suma, ontem, hoje e sempre, descobrir uma mulher oca, depois de muitas desculpas e justificativas, é triste e decepcionante. E os/as psicólogos/psicólogas não terão preocupação em sumirem do mercado de trabalho, os pacientes estão aí, até dentro de suas casas.

"Amanhã tem mais ..."

P. S.

(*) Infelizmente, cada vez mais, estudos apresentam-se em mídias digitais, o que recrudesce a credibilidade e sem foco na realidade. E a "mulher oca" não precisa, de fato, nem ter um perfil nas redes sociais com muita maquiagem,

(1) "Entre Sem Bater - Oscar Wilde - A Mulher Oca" em https://evandrooliveira.pro.br/wp/2024/06/21/entre-sem-bater-oscar-wilde-a-mulher-oca/

(2) "Entre Sem Bater - Oscar Wilde - Mal Interpretado" em https://evandrooliveira.pro.br/wp/2023/03/11/entre-sem-bater-oscar-wilde-mal-interpretado/

(3) "Entre Sem Bater - Jacques Abbadie - O Engano" em https://evandrooliveira.pro.br/wp/2024/05/09/entre-sem-bater-jacques-abbadie-lei-do-engano/

(4) "Entre Sem Bater - Arnaldo Jabor - A Estupidez" em https://evandrooliveira.pro.br/wp/2024/06/18/entre-sem-bater-arnaldo-jabor-a-estupidez/