FUTURANDO
Tenho medo do futuro, dos seus olhos e poros,
das suas mãos e corações.
Tenho medo das novas raízes, dos novos ventos,
dos novos gostos, das novas canções.
Quem ficará com as garras, chaves, rebarbas?
Quem assinará seus cheiros, melodias e gostos?
Talvez fique um turbilhão atroz, com desmandos a
granel e reis loucos escorrendo por todo canto.
Talvez seja respingado de sangue seco, de injustiças
graneladas, de ciladas feito poros sem fim.
O futuro já ensaia o seu chão e mostra quão ardidos
serão o seu eco e sombra.
De onde for, veremos essa grotesca algazarra se
esgarçando em busca de ar, de luz, de vida, do que for.
Saber que fomos nós os artesãos dessa sombria paisagem,
saber que coube a nós esganar suas flores, seus deliciosos quitutes,
suas maravilhosas cantigas de roda.
Saber que tínhamos os acordes para tecer rimadas brisas
e fizemos tudo ruir, feder e chorar. Quanto chorar.
E assim deixamos para os que virão essa sórdida sobremesa,
que ficará entalada nos confins das suas almas até sempre.