Entre Sem Bater - O Nepotismo Moderno

Jennifer Aniston disse:

"... meu pai virou ator de novela e eu fui figurante em uma cena de pista de patinação na novela. Eu não fiz o teste. Foi nepotismo o tempo todo ..."(1)

É provável que Jennifer Aniston seja a primeira Nepo Baby a fazer mais sucesso do que os pais no meio artístico que atuou. Entretanto, devemos ressaltar que a foi a primeira a reconhecer que, de certa maneira, recebeu os benefícios do nepotismo. Inquestionavelmente, é um fato raro alguém admitir que obteve alguma vantagem durante sua ascensão profissional. E o mais surpreendente é que muitos dos beneficiários(*) desta anomalia nem são bons no que fazem.

NEPOTISMO - ORIGEM E EVOLUÇÃO

O nepotismo é uma prática antiga que remonta às dinastias e monarquias de outrora. Anteriormente, e porque não dizer atualmente, o poder e a influência se mantém dentro das famílias, castas ou máfias.

O termo "nepotismo" deriva da palavra latina "nepos", que significa descendente ou neto, posteriormente também sobrinho. Originalmente, era a prática de alguns papas e altos funcionários da Igreja Católica na concessão de favores e posições a seus próprios sobrinhos. Este comportamento era comum durante a Renascença, especialmente dentro do contexto da Igreja. Desta forma, clérigos que não tinham filhos legítimos, buscavam perpetuar seu poder e influência por meio de seus parentes.

Ao longo dos séculos, o nepotismo se expandiu para além das fronteiras religiosas e monárquicas, infiltrando-se nas esferas governamentais e empresariais. No contexto moderno, o nepotismo tem associação comum a políticos e funcionários públicos que usam sua posição para beneficiar familiares. Em muitos casos, a qualificação ou mérito destes pouco importa, gerando absurdos como o conceito de meritocracia(2). Esta prática sofre críticas consistentes porque mina o princípio da equidade, promovendo a corrupção e a ineficiência.

A NOVA FACE - OS "NEPO BABY"

Nos últimos anos, surgiu uma nova terminologia siamesa do conceito tradicional de nepotismo a um contexto cultural mais amplo. O termo "nepo baby" refere-se aos filhos de celebridades ou pessoas influentes, herdeiras da fama e do status de seus pais. Assim sendo, recebem oportunidades e privilégios extraordinários desde o nascimento, de maneira fantasiosa e inexplicável.

Essa expressão se tornou popular nas redes sociais e na mídia, inclusive com admissão de culpa, como Jennifer Aniston expôs em sua frase. Em outras palavras, refletindo uma crescente conscientização e crítica sobre a desigualdade de oportunidades em vários setores, inclusive culturais.

Os "nepo babies" frequentemente encontram portas abertas em carreiras lucrativas e de prestígio, como no cinema, música e moda. Surpreendentemente, até mesmo em áreas acadêmicas ou empresariais, e não necessariamente por mérito próprio, mas pelos contatos de seus pais. Os exemplos incluem filhos de atores e músicos que conseguem papéis em filmes ou contratos de gravação sem precisar passar por seleções. Jennifer Aniston fez um reconhecimento corajoso; recentemente, Sasha Meneghel, filha da Xuxa, deu um depoimento semelhante. Desta forma, comprova-se que nem todos passam pelo mesmo rigoroso processo de seleção que outros aspirantes enfrentam.

A crítica em torno dos "nepo babies", sem dúvida, não se limita apenas à percepção de injustiça; ela também questiona o impacto cultural dessa dinâmica. Quando os mesmos rostos familiares dominam a mídia e a indústria do entretenimento, reduz-se a diversidade de histórias e talentos emergentes.

A predominância dos "nepo babies" perpetua um ciclo onde a criatividade e a inovação submergem em favor de manter o status quo e a mediocridade.

DUALIDADE E PARADOXO

Embora a crítica ao fenômeno dos "nepo babies" seja vigorosa, é importante reconhecer que essa questão possui nuances e paradoxos. Certamente, muitos filhos de celebridades enfrentam uma pressão intensa para corresponder às expectativas estabelecidas pelo sucesso de seus pais. Desse modo, a herança cria um ambiente de alta exigência e escrutínio público. Temos, por exemplo, filhos de jogadores de futebol famosos e craques que não conseguem superar a mediocridade. A comparação com os pais pode, em muitos casos, ser uma espada sobre a cabeça dos herdeiros.

Além disso, alguns "nepo babies" possuem de fato talentos notáveis e conseguem estabelecer suas próprias identidades e carreiras. Com toda a certeza, a partir de uma base de habilidades, mesmo se beneficiando das oportunidades iniciais de suas conexões familiares, podem despontar.

É também relevante destacar que o debate sobre os "nepo babies" reflete preocupações mais amplas sobre privilégio e mobilidade social. Em muitas sociedades, não são apenas os filhos de celebridades que se beneficiam de redes familiares e status. A prática de utilizar conexões para avançar na carreira é comum em diversos setores, desde a política até os negócios. Infelizmente, no Brasil e no ramo da política, o nepotismo tornou-se uma doença gravíssima, e um ótimo negócio(3).

NEPOTISTAS E SINECURAS

O nepotismo, em sua forma tradicional, e o fenômeno dos "nepo babies" contemporâneos, embora distintos, compartilham um núcleo comum. Contudo, existem outras condições que a sociedade, nem sempre, tem conhecimento ou busca fazer parte. Podemos afirmar, por exemplo, que a sinecura(4) das descendentes de militares é das piores espécies de nepotismo.

Seguindo a ideia original do nepotismo, a utilização de laços familiares para obter vantagens e oportunidades é, em muitos casos, uma vergonha.

Em suma, em qualquer destas situações, sublinhar as questões críticas sobre justiça, meritocracia e igualdade de oportunidades é nosso dever. À medida que o debate sobre esses temas floresce, é essencial buscar um equilíbrio que reconheça o mérito e o talento individual. Desta forma, enquanto desafiamos as estruturas que perpetuam a desigualdade e o privilégio sem mérito, devemos estar atentos.

 "Amanhã tem mais ..."

P. S.

(*) Os beneficiários do nepotismo, em muitos casos, são insuportáveis desde o berço, e acreditam que são bons. Embora recebam educação de qualidade, não sabem o que é viver fora da bolha do nepotismo.

(1)"Entre Sem Bater - Jennifer Aniston - O Nepotismo Moderno" em https://evandrooliveira.pro.br/wp/2024/06/17/entre-sem-bater-jennifer-aniston-o-nepotismo-moderno/

(2) "A Meritocracia é uma farsa" em https://evandrooliveira.pro.br/wp/2019/07/31/meritocracia-e-uma-farsa/

(3) "Um negócio (ótimo) de pai para filho" em https://evandrooliveira.pro.br/wp/2016/02/18/um-negocio-otimo-de-pai-para-filho/

(4) "Sinecura - As Rainhas e o Poder" em https://evandrooliveira.pro.br/wp/2020/02/04/sinecura-as-rainhas-e-o-poder/