Paixão na chuva

Dia 15, sábado, festa de São João, chuva a todo momento. Eu me abrigava embaixo de uma pequena tenda e vi um casal dançando em meio à chuva. Eles não sorriam; eles riam, gargalhavam, brincavam feito crianças. Se olhavam como se um fosse o universo do outro. Tive certeza: paixão.

Olhavam-se, dançavam, brincavam no meio do toró que caía. De repente, um beijo. Beijavam-se sorrindo, mas com paixão. Naquele momento percebi que o que tinha ali era a mais pura paixão: pelo momento, pela dança, cultura, pessoa, sentimento. Um beijo onde eles simplesmente não ligavam para o redor; só existiam eles naquele universo. Não dançavam forró direito, mas foi o forró mais bonito que já vi.

Apaixonado pela paixão, não sabia o que sentia; não sabia que sentir. Veio a sentir ciúmes por um momento; queria eu estar ali. Mas não retirar a paixão deles; mas sentir o que eles sentem; saber como é se molhar feito criança e não ligar; beijar-se na chuva em meio a sorrisos e uma dança como se o mundo fosse feito para mim e alguma pessoa. Sim, alguma… Procurei em minha mente alguma pessoa que algum dia quem sabe fizesse sentir isso.

Na hora me veio à memória uma vaga triste e feliz memória minha com uma amiga dançando tango na chuva. Acho que eu devia ter uns 17/18 anos. Lembro dessa memória bem: nós dançávamos na chuva em frente à casa da vó dela; chão de barro já tinha formado poças de lama mas a tal ponto nós nem ligávamos para isso e entre sorrisos, risadas, gargalhadas e o tango mais feio que você pudesse imaginar, o momento perfeito acabou. Quem dera eu ter completado tal momento e selado ele com um beijo totalmente cinematográfico, mas apaixonado.

O pequeno espaço onde estava me abrigando foi ficando apertado. Me deparei com uma criatura: uma linda criatura mais ou menos da minha estatura, cabelos pretos lisos, rosto afilado, olhos castanhos e lábios vermelhos.

Na minha memória fértil dado ao devido momento me imaginei com aquela bela criatura na chuva dançando sem ligar para ninguém e para nada. Dei uma breve encarada; quis ver melhor a cor dos seus olhos meio cor de mel.

Quando me dei por mim estava encarando seus lábios vermelhos, imaginando situações onde em algum momento a gente fosse se falar mas percebi que em nenhuma das possibilidades eu iria falar com a criatura mas sim ela viria até mim. Achei egoísmo e virei o rosto.

Com o passar do tempo pessoas foram desistindo de esperar a chuva passar e nós fomos ficando cada vez mais distantes um do outro até que estávamos um em cada ponta do local o mais distante possível da tal criatura. Logo tive que sair pois a chuva estiou indo para casa me questionando: será que aquela paixão ainda está lá?