Há quem diga que escrever é tarefa fácil, como discorria Neruda "Escrever é fácil. Você começa com uma letra maiuscula e termina com um ponto final. E no meio você coloca as ideias".
É Neruda, você até que tem razão! Da letra maiúscula ao ponto é seguro consultar as regras gramaticais portuguesas para uma linguagem robusta e que esteja de acordo com os tratados da pátria. Mas e o meio, Neruda? Ah, o meio...
Escrever é como falar sozinho. Não há conteste. É você com você e pronto. Amparado por crenças, cultura, conhecimento e o meio.
Até que a coragem de publicar desponte, é você e o texto: numa sintonia que parece perfeita.
Por uns segundos a ideia te faz companhia como se fossem feitos um para o outro num universo paralelo equilibrado e ideal. Mas cai na rede. A "promiscuidade literária" causa descontrole no relacionamento. "É o fim do amor sincero que senti..."
Escrever é se colocar num campo de batalha e ver morrer, entre as trincheiras, as ideias mal estruturadas, os egos inflados, a solidão e a convicção. Ninguém volta de uma guerra sem aprender algo novo, nem de uma escrita sem outras perspectivas. Não há compromisso com o erro. É inevitável ser implodido por bombas de efeito moral.
Queria escrever como se fosse confeiteira. Recheando as linhas com biscoitos finos e cobrindo-as com chocolates suíços. Para que os paladares mais exigentes, fossem tomados pelo prazer de um sabor inigualável, e voltassem para o próximo suspiro.
Ou quem sabe como uma alegoria de carnaval em que paetês e lantejoulas fizessem brilhar os olhos dos que me vêem pelo que expresso em palavras?
Queria escrever fácil, driblando a lógica da racionalidade e amparando os sentimentos e emoções, como se fossem superlativos, no seu maior grau de excelência.
Mas Neruda, aqui entre nós, escrever é difícil. É como "sonar" em alto mar e, esperar que as ondas sonoras acompanhem as do mar. Não é porque é onda que tem o mesmo sentido...
O campo de ideias vive atordoado pelo meio, e se confunde com ele: ora traz liberdade, ora aprisiona. Um cabo de guerra entre o concreto e o abstrato, entre o ser e não ser, entre viver e morrer, entre A ou B.
Escrever é condição humana que sufoca o medo com um travesseiro de plumas, cujas penas viram asas.
Só aquele que ousou juntar palavras, aprendeu silenciar seus "demônios", encharcar seus desertos e disfarçar os sulcos de lágrimas da face.
Por isso, diria que nessa miopia da escrita, só caberia uma crônica lírica...