Como em muito outros jardins, havia neste um jardineiro que era visceralmente inimigo de flores!
Pisava-as sem dó nem piedade, favorecendo antes as ervas daninhas, que prosperavam e medravam felizes, oprimindo e empurrando as flores que, por dever, deveria cultivar.
Tinha este jardineiro uma espécie de devoção a seu amo, um louco apreciador de coutadas onde pudesse caçar seres inocentes, que tratavam das suas vidinhas, dos seus territórios, da sua procriação e alimento.
O jardineiro vacilava entre o ciúme e a ambição!
Cortava as flores das principais hastes, impedindo que crescessem; não as regava; jamais adubava o solo, antes fazia queimadas a torto e a direito, destruindo as mais rasteiras, as sem espinhos, os amores-perfeitos, dálias, jasmins olorosos cujo perfume o enfastiava.
Odiava sobretudo os cravos e, dentre estes, destruía ferozmente os de cor vermelha, pois lhe lembravam não sei que tristes tempos da sua infância perdida.
Em vão choravam as margaridas e oravam as açucenas!
Colhendo-as sem cuidado, apresentava-as em vistosas coroas a seu amo louco, que nem tão pouco cuidava de as colocar numa jarra, deixando-as murchar no auge da sua beleza.
Claro que sem flores não há frutos e sem frutos não há sementes!
Bem se ralava o jardineiro!
Tivesse boas fardas para seu uso, tivesse bons ginetes para os seus passeios... afinal o emprego parecia ser efémero, o que viesse a seguir que replantasse, que se desenvencilhasse, que fizesse o que lhe aprouvesse... por essa altura já ele estaria fora; teria dado o pulo para um jardim mesmo seu, que comprara num paraíso distante!