OLHA SÓ ESSE AMOR

Simplesmente comovente a cena diária que se desenrola todas as tardes no shopping próximo do condomínio onde moro. Geralmente acontece por volta das cinco horas da tarde, horário em que retorno da caminhada e sento num dos bancos na calçada do estabelecimento. O carro chega dirigido por uma senhora tendo ao lado um jovem esqualido de olhar perdido, estaciona, desce , contorna o veículo até a mala e de lá retira uma cadeira de rodas dobrada.

Depois de desdobra-la, fecha a mala e segue na direção do carona. Durante toda essa movimentação dela o jovem não move um dedo, parece nem saber onde está. Ela abre a porta e carinhosamente o retira nos braços. O choque: ele é esquelético, desprovido de movimentos, o corpo dando a aparência de ser composto apenas de ossos.

Cuidadosamente a mulher o coloca na cadeira, altera a posição da cabeça para deixa-la confortável no pequeno travesseiro, dos braços e das pernas inertes, fecha o carro e sai empurrando a cadeira de rodas para a entrada do shopping. Em nenhum momento a criatura se move nem mostra sinal de vida. Desconheço o tipo de enfermidade que o acomete, só percebo o quanto é cem por cento dependente dela.

Algum tempo depois eles voltam, o jovem parecendo não ter feito nenhum

movimento desde o momento em que foi posto na cadeira especial. Sorrindo, a senhora abre o carro, recolhe o jovem, acomoda-o muito bem, tranca a porta, dobra e guarda a cadeira de rodas na mala, entra, liga o carro e vão embora.

Todos os dias ela sorri enquanto cumpre seu incrível destino. Não sei qual o parentesco entre os dois, mas penso que aquele sorriso bonito exalando amor fortalece em mim a hipótese de serem mãe e filho, ela amando incondicionalmente na alegria e na dor, ele absolutamente incapaz em virtude de alguma deficiência motora e cerebral, ambos mostrando às pessoas de que o manancial de amor materno é capaz. Afigura-se gigantesca a dedicação daquela mulher ao rapaz de aspecto atrofiado, notadamente a delicadeza de seus gestos e a ternura nos olhos ao carrega-lo nos braços amorosos. Coisa de mãe certamente, discordo de qualquer outra explicação. Impossível não me emocionar.

Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 06/06/2024
Reeditado em 07/06/2024
Código do texto: T8080032
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