Sagrada Mercedes-Benz
Na terça-feira da semana passada (27/05/24), estive num ônibus. Essa já é a terceira crônica que escrevo tendo o ônibus como cenário. Porém não é à toa, é ele que põe meus pés no mundo. Se eu tivesse carro ou moto, talvez escrevesse sobre o trânsito da minha cidade. Mas já que não tenho veículo particular (bicicleta não conta, e aqui em casa ela é compartilhada entre três pessoas), meu transporte é coletivo. Voltemos ao ônibus.
Eu queria descer do ônibus. Perto da porta de saída haviam duas pessoas; uma mulher de vestido e um rapaz com uniforme escolar. Não lembro o motivo, mas senti raiva de um deles. Talvez por estarem no meu caminho para a saída (gosto de imitar o Nelson Rodrigues e confessar pecados nas crônicas).
Estando eu em pé próximo aos dois, por algum motivo, senti que, por alguns segundos, nós três éramos uma coisa só. Emergiu em mim um sentimento de união, um sentimento de manada ou multidão que muitas vezes o coletivo me fornece. Um senso quase religioso, de que compartilhávamos alguma coisa transcendental. O ônibus me fez sentir uma só alma com aqueles três desconhecidos, alheios a mim. Mas a massa parece suscitar o homem primitivo, que sente amor e ódio sem grandes arrazoamentos. Desci do ônibus e rompi com a neurose.