Saudoso jogo de Bets
O jogo de Bets era diversão certa entre os meninos da vila. Corriam descalços na erupção do asfalto e não reclamavam nadinha. As garotas até jogavam um pouco, mas na primeira esfoladela. Saíam resmungando: — Brincadeira bruta!
A malandragem infantil começava no par ou ímpar. Piscadelas e caretas determinavam as duplas, os demais fingiam cara de bobo, pois isso aumentava a rivalidade. Um bom jogo de Bets precisa desse tempero.
Com shorts de educação física e mais nada, corriam semidesnudos de um lado para outro quando o rebatedor mandava a bolinha lá pras cucuias. Depois de pontuar era praxe a zombaria com os adversários. Tática para gerar desequilíbrio. Desde criança usamos artimanhas, mas tudo isso passa despercebido pela maioria. Esse tipo de coisa já vem de fábrica.
Jogavam a tarde toda. Se acabava antes era por causa de alguma mãe chata que clamava pelo filho: — É hora de estudar, venha agora! — ou por algum jogador ter perdido a unha na hora do arremesso. Às vezes, o taco de madeira beijava a testa do amigo que ficava atrás do rebatedor. Nesse caso, o pau comia literalmente.
Depois das partidas, a amizade estava mais forte. Não havia desentendimentos que se prolongassem. O elo era rígido. Quão importante isso não foi para a formação da personalidade? A preparação espiritual para o mundo adulto que vinha ao nosso encontro.
— Tuc! Tuc! Eu sou o mundano e vim lhe apresentar minhas mazelas…
Os anos fugiram aos olhos, e o contato com velhos amigos diminuiu. A sinceridade infantil perdeu para a hipocrisia adulta. Raul Seixas estava certo quanto à metamorfose ambulante.
Um grande abraço aos jogadores de Bets!