Rebolar pau ou pedra, jogar rebolo

 

Lembrei-me hoje de falar de um emprego do verbo rebolar, verbo este que tem vários significados dicionarizados. Há, porém, um significado bem comum para nordestinos e seus descendentes que não encontrei nos dicionários: arremessar, jogar ou atirar (pedra, pau, seixo, ou qualquer outro objeto pequeno). Embora a conheça desde criança, por ser comum no meio dos meus parentes cearenses, maranhenses e piauienses, não encontrei nos dicionários que consulto essa acepção de rebolar. Sabe aquela história de atirei o pau no gato? Pois é, eu, quando criança, certamente diria: “Rebolei o pau no gato.”

 

O verbo rebolar consta no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, e é dicionarizado com vários outros significados, mas não com o de arremessar, jogar ou atirar pedra, pedaço de pau, seixo, ou coisa similar. A despeito disso, curiosamente, deriva de rebolar o substantivo rebolo, também regionalismo nordestino que conheço desde criança. Rebolo é pedra, pedaço de pau, seixo, ou qualquer pequeno objeto arremessável em algo ou em alguém. E é dicionarizado com essa acepção aí e com várias outras mais. 

 

Rebolar um pau no cachorro é o mesmo que jogar um rebolo no cachorro. Aliás, rebolar pau e pedra ou jogar rebolo em cachorro, isso eu fiz muito quando criança e até mesmo adolescente, na zona rural. Não o fazia por maldade, mas por medo. Fui um menino de roça que morria de medo de cachorro e de boi, ou de vaca. Cortava estrada, para me desviar. Andava um tempão por dentro do mato, se na minha avaliação fosse necessário, só para não passar a pé na frente de cachorro, de boi, ou de vaca, mas, quando isso não me era possível, eu apelava para o rebolo. Rebolava pedra, pau e o que me estivesse ao alcance.

 

A mesma coisa diga-se de “cachet” (pronunciado “caché”). É um substantivo muito usado por meus parentes, amigos e conhecidos com o significado de comprimido. Como eu escrevi, há anos, na crônica “Tomar um ‘cachet’”, ouvi muitas vezes, quando criança, adolescente e até mesmo na juventude, frases como estas: “Estava com dor de cabeça e tomei um ‘cachet’, para aliviar”; “dá um ‘cachet’, que passa”, e assim por diante.

 

“Cachet” é comprimido em francês e como tal muito comum no Maranhão e no Piauí, por exemplo, mas, com essa acepção, não é dicionarizado nem como estrangeirismo e, que eu saiba, até a publicação da minha crônica, não existia abonação literária desse uso. Pode até existir, mas não encontrei. Vale a pena, garanto, ler a crônica “Tomar um ‘cachet’”. Por falar em dicionários e escritores, encerro com Rui Barbosa: “E se me declinam da autoridade coercitiva dos dicionários, apelo para os clássicos modernos.” É, eu também amo dicionários e abonações literárias.