A palmeirense

Paula tem 31 anos, é engenheira civil e torce para o Palmeiras.

O nome, a idade, o ofício profissional não me impressionaram. Afinal, Paula é um nome comum, ter mais de trinta anos, atualmente, está na moda e a engenharia civil, há algum tempo, deixou de ser tarefa exclusivamente masculina. O que me provocou surpresa imediata, um "uau" arrebatador e duradouro, foi o fato de Paula torcer para o Palmeiras.

Como uma mulher chamada Paula, com mais de 30 anos de idade e engenheira civil escolhe torcer para o Palmeiras, sendo que há o Flamengo, o São Paulo, o Corinthians, essas opções mais populares e de grande aceitação entre as mulheres nacionais?

Ninguém mais apropriado que Paula para responder.

Estávamos sentados lado a lado em uns bancos vermelhos e brancos, de lanchonete popular, de beira de estrada. Eu estava vestido com a camisa do Palmeiras e uma coxinha na mão. A mesma camisa e única, que tenho há quase dez anos. Paula estava de branco e um copo de Coca-Cola. Foi quando olhou para mim, com aquele copo de Coca-Cola na mão, para me perguntar, para minha surpresa total, se sou palmeirense. Fiquei meio embasbacado e totalmente contente com a pergunta.

Falar sobre o Palmeiras é, sem dúvida, melhor que falar sobre meteorologia. Para puxar assunto, Paula poderia perfeitamente ter olhado para mim e dito "Que calor! Você não acha?". Seria uma pergunta natural e esperada até, dadas as circunstâncias. Porém Paula foi direto ao ponto, foi específica, engenheira.

Ofereci-lhe, por educação, um pedaço de coxinha. Paula foi mais educada ainda e aceitou. Então ela me falou que também é palmeirense, e de berço, o que vai de encontro à estatística. De acordo com a numerologia, não há palmeirense de berço. Tornar-se palmeirense ao longo do caminho, mas não na largada. Paula é uma exceção que eu pensava que não existisse.

Para minha admiração, Paula não só entende de engenharia civil, mas também de Palmeiras, de escalação, de contra-ataque, tiro de meta, escanteio, impedimento, pênalti. Sabe de cabeça e coração a escalação do Palmeiras campeão da Libertadores do ano de 1999. Dita e soletra o nome completo do técnico do Palmeiras e de todos os jogadores, reservas e titulares. Revela ainda que sempre se veste de verde ou branco; que já foi pessoalmente Allianz ao Parque. O hino do Palmeiras é seu toque oficial do seu celular, sua música favorita no mundo. Suas senhas têm sempre o palmeiras envolvido, direta ou indiretamente. Seus principais passatempo: assistir aos jogos do Palmeiras, falar sobre o Palmeiras, ler livros e artigos, sobre o Palmeiras.

Paula é de um amor ao Palmeiras que impressiona, mesmo aos palmeirenses convictos. Pode-se dizer perfeitamente que Paula é uma palmeirense fanática. Para muita gente, inclusive para mim, o Palmeiras é um passatempo, uma distração gostosa e às vezes nem tanto. Mas quando falamos com a palmeirense Paula, sentimo-nos meio palmeirenses nutella, como se nada soubéssemos sobre o Palmeiras.

Ficamos sentados quase meia hora naqueles bancos vermelhos e brancos da lanchonete beira de estrada, falando de e sobre o Palmeiras. Lá fora, aquele calor, aquele frio, a violência, a inflação, as guerras declaradas ou ocultas, as crises humanitárias, econômicas, sociais, as enchentes, as secas, o aquecimento global, a privatização das praias... Todas essas e outras questões mostrando-se irrelevantes para serem debatidas no momento, evidenciando-se serem questões menores diante da grandiosidade do Palmeiras. Foi quando lamentei o mundo não ser constituído 100% de palmeirenses feito Paula. Foi quando adveio o fastio, e ofereci a outra banda da coxinha à Paula, a palmeirense.

Damião Caetano da Silva
Enviado por Damião Caetano da Silva em 01/06/2024
Reeditado em 01/06/2024
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