FRAGMENTOS DA ALMA

Despedaçam-se de mim fragmentos emocionais quando escrevo, assim como a pele das cobras envelhece, cai e é substituída de tempos em tempos por. A comparação pode parecer esdrúxula, mas é apenas questão de similitude, isto é, na escrita nos desprendemos igualmente das coisas velhas grudadas no corpo e na alma no intuito de conquistar diferentes perspectivas. Ou simplesmente para vê-las sumindo na poeira das palavras.

No entanto ao contrário dos ofídios, cuja troca de pele ocorre devido a fatores biológicos, meus sentimentos em pedaços se vão nas palavras esmiuçadas por motivos de catarse, algo assim a título de provável desabafo, dir-se-ia o desamarrar de inutilidades acumuladas ao longo das ilusões, sonhos e desilusões arraigadas na alma. Alivia o coração retirando os fardos de anos do meu viver, vão-se os anéis enferrujados dos sentimentos pesados e ficando os dedos da possibilidade de sonhos mais auspiciosos. Permanece o essencial no poço das memórias.

Talvez literatura seja um pouco disso, em parte, pois claro muito de nós, do que vivemos, almejamos e quimeras pelas quais suspiramos, ainda que de forma sutil, pousa na fantasia das criações beletristas. Ouso até garantir que seria quase impossível elaborar obras, mesmo as mais fantásticas e mirabolantes, sem imprimir nelas resquícios de nossos devaneios, de nossas pegadas doces, e às vezes também amargas, experenciadas na jornada da vida. E são justamente essas invisíveis pecinhas do mosaico de minha existência que se soltam de mim, que são arrancadas da alma durante o singelo instante turbinado pela emoção de viajar nas asas das palavras, que respingam nas páginas dos meus rabiscos literários.

Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 28/05/2024
Reeditado em 28/05/2024
Código do texto: T8073183
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