Entre Sem Bater - Brilhar ou Iluminar?

Magaly Reinaldo disse:

"... o mundo precisa de menos gente que brilha e mais gente que ilumina ..."(1)

A jornalista Magaly Reinaldo, a Meg, também poetisa, consegue expressar através de suas frases o que muitos desejam dizer. Desse modo, quando ela cria frases alternativas na comparação entre brilhar e iluminar, devemos refletir.  São frases simples, mas que ganham contornos relevantes em função de contextos peculiares e instigantes.

BRILHAR OU ILUMINAR?

Explorar as diferenças entre os termos brilhar e iluminar, certamente, pode atrair a curiosidade de muitos leitores que imaginam ser tudo igual(*).

Em primeiro lugar, o brilhar tem utilização e aplicação em algo que emite luz própria. No contexto físico, aquilo que brilha é porque emite luz através de um processo interno, como a combustão ou a partir de um processo físico-químico. O sol, por exemplo, brilha porque está realizando reações nucleares que produzem luz. Num sentido figurativo, quando dizemos que uma pessoa “brilha”, nos referimos a alguém que se destaca, que mostra algo diferente.

Por outro lado, “iluminar” é um termo que geralmente se refere à ação de fornecer luz para algo, tornando-o visível ou mais claro. Um objeto que ilumina não necessariamente tem luz própria, mas pode refletir ou espalhar a luz que recebe de outra fonte. A lua, por exemplo, não tem luz própria, mas ilumina o céu noturno ao refletir a luz do sol. No contexto humano, quando dizemos que alguém “ilumina” um ambiente é porque traz algo que ajuda as pessoas a evoluírem. Em outras palavras, fazemos referência a alguém cuja presença torna o ambiente mais agradável ou cujas ações ajudam a esclarecer as coisas.

ACEPÇÕES E NUANCES

Embora os termos e palavras tenham sinônimos e antônimos similares e acepções com relação estreita, possuem nuances mais do que semânticas. Eventualmente, as palavras, da forma como Magaly Reinaldo utiliza, são verdadeiros pensamentos poéticos.

Desse modo, uma variação da frase-chave deste texto adquire a capacidade de nos colocar para refletir sobre brilhar e iluminar.

- "O mundo precisa menos de gente que brilha, e de mais corações que ouvem no silêncio e enxergam no escuro." (Magaly Reinaldo)

Em suma, brilhar é sobre ter luz própria, seja literalmente, como uma estrela no céu, ou figurativamente, como uma pessoa com talento inato. Ilumina, por outro lado, é sobre melhorar a visibilidade ou clareza de algo, seja refletindo luz, como a lua faz. É também a possibilidade de ajudar na orientação e na clareza, como bons professores costumam fazer.

Esses termos, embora relacionados à luz, têm uso comum ​​para descrever qualidades humanas. Percebe-se uma pessoa que “brilha” como alguém com um talento ou habilidade natural. De outra perspectiva, uma pessoa que “ilumina” é alguém que traz clareza, compreensão ou alegria para os outros. Ambos são elogios, mas cada um destaca um aspecto diferente do caráter de uma pessoa.

MUNDO DIGITAL

Na era das redes sociais e num mundo predominantemente digital, a distinção entre brilhar e iluminar revela-se de maneira pungente.

Brilhar, nessa metáfora digital, refere-se ao ato de atrair atenção, muitas vezes de forma superficial e efêmera. Iluminar, por outro lado, implica trazer clareza, entendimento e um sentido mais profundo de propósito e orientação. Surpreendentemente, no mundo digital, observa-se uma inclinação predominante para o brilho e o egocentrismo à moda Luís XIV. Certamente, a verdadeira iluminação sofre com negligência, indiferença, e combates desiguais.

O ambiente digital privilegia a cultura onde o valor da luz mede-se pelo número de curtidas, compartilhamentos e seguidores. As pessoas buscam incessantemente por validação externa, criando personas com fantasias(2) e máscaras para brilharem. Este desejo de brilhar frequentemente leva a comportamentos egocêntricos, onde a importância recai sobre a imagem. Desta forma, projeta-se a pessoa e não o conteúdo que ela transmite ou a sua autenticidade.

Nesse contexto, muitos usuários das redes sociais se empenham em destacar-se a qualquer custo, ofuscando outras vozes. O egocentrismo digital promove a busca pela atenção, com recompensa à superficialidade e a valorização do conteúdo raramente aparece. Desse modo, a busca insana pelo brilho sem transmissão de conhecimento manifesta-se de várias formas:

. postagens com exageros e distorções;

. aparências e fantasias sem controle;

. ostentação de estilos de vida;

. disseminação de desinformação.

O OUTRO LADO DA MOEDA

Paralelamente, há aqueles que lutam para iluminar sempre, compartilhando conhecimentos, fazendo o debate construtivo e incentivando o pensamento crítico. Esses, em minoria, trabalham para resgatar as pessoas do obscurantismo, tentando trazer luz às sombras do desconhecimento e da ignorância. Contudo, a tarefa é árdua porque, como disse o pensador, os ignorantes então em maioria. A cultura do brilho instantâneo frequentemente silencia ou distorce essas vozes, minimizando seu alcance e impacto.

Um exemplo da atualidade é, com toda a certeza, a proliferação e expansão da estupidez das fake news. As informações falsas tendem a ser mais sensacionalistas e, portanto, mais compartilháveis do que as verdades ou a realidade. Aqueles que se empenham em desmascarar essas falsidades e promover a verdade frequentemente enfrentam oposição e ataques. Recebem, outrossim, rótulos de desmancha-prazeres ou até mesmo como ameaças diretas de stalkers. A batalha contra as notícias falsas e a ignorância é emblemática dessa luta entre o brilho ilusório e a iluminação autêntica.

Como se não bastasse, uma grande barreira na tarefa de iluminar é a cultura do cancelamento, que ilustra bem essa dinâmica atroz. Indivíduos que tentam iluminar, apresentando opiniões dissonantes ou levantando questões difíceis, sofrem ataques de multidões de perfis. Estes cancelamentos não são, inquestionavelmente, por falta de validação das palavras e ideias. Surpreendentemente, são porque sua luz ameaça ofuscar o brilho superficial de uma narrativa mais confortável e menos desafiadora.

GENTE QUE ILUMINA

Desse modo, devemos ressaltar que essa busca incessante pelo brilho alimenta o obscurantismo, e também gera ciclos de frustração e insatisfação. Mesmo que a validação externa seja volátil e efêmera, deixando um grande vazio, muitos preferem. Por outro lado, aqueles que iluminam encontram um sentido mais consistente em seu trabalho, mesmo com pouco reconhecimento e limitações. Eles compreendem que sua contribuição é valiosa e necessária, especialmente em tempos de obscurantismo crescente.

A solução para essa dicotomia reside em uma mudança de perspectiva coletiva, mesmo com o tsunami digital da IA e conflitos geracionais. As plataformas digitais, aplicativos e seus usuários deveriam privilegiar a ideia de iluminar ao invés de brilhar, especialmente nas recompensas.

Por isso, ao incentivar a educação digital e promover, por exemplo, a verificação de fatos deveria haver recompensas e punições aos falsários. Além disso, é crucial fomentar uma cultura de respeito verdadeiro, sem hipocrisia, pelas opiniões alheias.

Enfim, iluminar verdadeiramente advém da combinação do brilho com substância, conteúdo e propósito coletivo. As pessoas podem e devem buscar visibilidade, mas essa visibilidade deve se dar por contribuições significativas que promovam o bem comum.

Desse modo, podemos transformar as redes sociais em plataformas de crescimento e aprendizagem. A luz do conhecimento deve superar o brilho vazio da vaidade e o obscurantismo da ignorância(3).

As diferenças entre brilhar e iluminar são simples:

Brilhar enfatiza e destaca a perspectiva e a conotação e notoriedade individualista.

Iluminar apresenta a luz com foco nas funções de educar, instruir, ilustrar, clarear, esclarecer e construir coletivamente.

"Amanhã tem mais ..."

P. S.

(*)  O açodamento e a falta de cuidado das pessoas desta geração digital provoca a proeza de que palavras diferentes pareçam iguais.

(1) "Entre Sem Bater - Magaly Reinaldo - Brilhar ou Iluminar?" em https://evandrooliveira.pro.br/wp/2024/05/22/entre-sem-bater-magaly-reinaldo-brilhar-ou-iluminar/

(2) "Entre Sem Bater - Edward Snowden - Fantasia e Realidade" em https://evandrooliveira.pro.br/wp/2024/05/08/entre-sem-bater-edward-snowden-fantasia-e-realidade/

(3) "Entre Sem Bater - Isaac Asimov - A Sua Ignorância" em https://evandrooliveira.pro.br/wp/2023/12/13/entre-sem-bater-isaac-asimov-a-sua-ignorancia/