O salto mortal

Era tarde quente em Brotas. Ótima oportunidade para mergulhar no rio Jacaré-pepira. A ponte da Avenida Mario Pinoti estava repleta de curiosos que assistiam aos saltos acrobáticos dos nativos. Jovens magricelas lançavam-se do guarda-corpo com maestria. As acrobacias eram diversificadas, mas alguém sempre errava, e dava para escutar a barriga beijando o leito do rio. Só de lembrar…

Olhando os saltos dava até vontade, contudo o frio na barriga dizia: — não pule. Eu estava com a família da namorada, todos brotenses. O meu cunhado estava acompanhado pela Naiara. Adolescente com sorriso de criança. Tinha longo cabelo encaracolado. E logo se percebeu sua atração pela água.

— Olha! Que salto lindo — seus olhos até brilhavam.

— Eu vou pular! — disse, tirando o tênis e a meia.

Ficamos surpresos, pois achávamos que ela estava brincando. Não duvide de uma jovem determinada. A vontade vem de dentro, ninguém controla, a não ser ela mesma. Mas não era o caso.

Eu fiz a pergunta mais óbvia: — Você sabe nadar? — No frenesi que a dominava, ela meneou a cabeça afirmando. Não havia meio de convencê-la do contrário. O cunhado tentou, mas foi em vão. Ela se inclinou no guarda-corpo com aquele cabelão. Nesse momento eu percebi que ela entendeu o perigo, pois era um salto de vinte metros, mais ou menos. A careta de dúvida surgiu. Pular ou não pular?

— Naiara, esquece isso. O rapaz disse que é fundo. Vamos embora… — falou o cunhado.

Ela ficou pensativa por um instante. Olhava os nativos saltando e gritando de alegria. A jusante do rio seguia lentamente seu rumo. O sol escaldante obrigou a parentela a procurar por sombra.

Eu fiquei com o casal, não sei porquê. Eu não me intrometi, mas também não queria vê-la em perigo. Um mau pressentimento invadiu minha mente. Não teve jeito, a coragem falou mais alto. E Naiara subiu no guarda-corpo.

O salto foi sem graça, não teve acrobacia alguma. Mas o desfecho foi como previ.

Naiara começou a beber água e afundou algumas vezes. O cunhado se despiu rapidamente e pulou de qualquer jeito. Eu observava tudo de cima da ponte. A minha namorada e suas primas já estavam chorando.

Naiara agarrou o pescoço do cunhado igual a macaco no galho. A partir daí, os dois começaram a afundar. Eu fiquei imóvel, aquilo era surreal. Como assim, meus amigos se afogando. Não tive coragem de pular, eu até sei nadar um pouco. Porém, não consegui, o medo me deixou em “off”.

Surge um rapaz magricela e todo molhado. Subiu no guarda-corpo e pulou. Com desenvoltura e tranquilidade tirou os dois da água. Se não fosse esse nativo, o casal teria se afogado.

Quem disse que acrobata não pode ser herói?

Rivaldo Ferreira
Enviado por Rivaldo Ferreira em 18/05/2024
Reeditado em 19/05/2024
Código do texto: T8065910
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