UM PRAGMÁTICO ROMÂNTICO
UM PRAGMÁTICO ROMÂNTICO
Estou em transição – da poesia ao pragmatismo. Não sei se é melhor ter consciência disso ou não saber. Saber dói. Mas, não estou inerte. Estou reagindo para não me perder diante das tantas cobranças que me faço e que o mundo me faz. Prático ou teórico demais? Estou teórico-prático enquanto quero ser poético-prático. A agenda não deve ser meu único guia. Agora mesmo, enquanto escrevo, faço o esforço de dar uma pá da minha mente e uma do coração. Quero ser um pragmático romântico, não um romântico pragmático.
A verdade é que, mesmo no academicismo, eu me reconheço poeta, porque faço com paixão. É que essa paixão demais sufoca e, às vezes, nós temos que desopilar trabalhando mais com gente do que com livros. O que não quero é perder a sensibilidade, deixar de ver o que há por trás dos gestos. Quero o direito de ter o pensamento livre quando assistir a um filme ou quando ler um livro qualquer, de não ficar histérico quando achar que estou perdendo tempo com algo fútil. A vida não é feita apenas de importâncias, mas, também, de “desimportâncias”. Eu me importo, me exporto, sou porto de chegadas e partidas.
O que me atormenta é saber que os desonestos, maus-caracteres, também estudam e se esforçam para conquistar os seus espaços. Não posso me render diante de tantas pessoas que só visam derrubar os outros porque não conseguem se alicerçar no próprio espírito. É até admissível ficarmos com inveja de alguma materialidade que não está ao nosso alcance, como ter os bilhões de Ellon Musk (não tenho esta inveja), mas da disposição para lutar, das produções literárias, culturais, acadêmicas, das pessoas que têm a nossa idade ou até menos, isso é ridículo!
Às vezes nós ficamos reparando tanto no que o outro faz/fez que acabamos por esquecer aquilo que fizemos e ainda podemos fazer. Estou aqui fazendo aquilo em que acredito, do jeito como confio, sem contar com o destino ou com o quer que seja. Qualquer êxito será sinônimo de sorte para quem não desfrutá-lo. Dormir com a consciência tranquila, sentir que fui o ser humano que pude ser naquele dia, já me contenta. Não irei definhar se não cumprir o capricho de outrem.
A vida não é nada sem paixão. Até para atravessar uma rua devemos tê-la. Alguém já disse isso. Mas, certas coisas, é preciso repeti-las. Que eu seja denominado chato, egoísta, prepotente ou arrogante por quem não entender que quero ser um pragmático-romântico. Será assim, bem sei, a prática é mais importante neste mundo em que ser romântico é sinal de pieguice.
Mais: “sou uma pessoa muito ocupada: tomo conta do mundo”, como disse Clarice Lispector. Nem que seja “apenas” o meu mundo – isso já é uma grande ocupação, pois há muitos que não o fazem e exigem que outra pessoa cuide por ela. Tomar conta do mundo não é ser ensimesmado. É abarcar vários horizontes em um só. Para isso, preciso antes ser paciente se quiser ser agente. Senão o mundo toma conta de mim e, por tanta avidez, me perco.