SENNA - 30 ANOS

Para mim, foi assim:

Eu tinha acabado de chegar de Vitória, Espírito Santo.

Eu trabalhava lá.

Estava em Nilópolis para passar só o fim de semana.

Descansava em meu antigo quarto, quando minha mãe entrou esbaforida e disse:

"- O Senna bateu o carro! Tão dizendo que ele morreu."

Dei um pulo da cama.

Liguei a tevê.

O repórter Roberto Cabrini entrou ao vivo e confirmou o que ninguém queria ouvir.

Ímola do verbo imolar.

GP de San Marino

Curva Tamburello.

Barra de direção quebrada.

Helicóptero na pista.

Hospital Maggiore, em Bolonha.

Tudo isso ainda vive em minha cabeça, palavras soltas.

Eu tinha 18.

Hoje tenho 48.

A seleção nem era Tetra.

Agora, quer o Hexa.

Aquela cena da minha mãe entrando no quarto...

Pra mim, era pesadelo.

O Cabrini, na tevê, com a notícia fatídica... tudo pesadelo.

Mas faz 30 anos hoje.

Nesse feriado do dia do trabalho.

Esse pesadelo faz 30 anos.

Faz 30 anos que a gente não acorda dele.

Nem a gente sabia que gostava tanto do cara.

Nem a gente sabia o quanto ele era a nossa cara.

Aquele punho erguido, aquelas vitórias...

A gente queria ser campeão também.

A gente queria agitar a nossa bandeira.

A gente queria ter orgulho do Brasil, de ser brasileiro.

Quase nunca dá, mas a gente queria.

Senna gostava de tudo certo.

Era arrojado, até brigão, mas vencia do jeito certo.

Senna representava a exatidão, o milésimo de segundo, o absurdo cronometrado.

Senna era quase o vento.

Era aquilo que a gente queria ser.

Era campeão.

Uma, duas, três vezes.

Na chuva, era barbada.

Pole position? Barbada.

De domingo a domingo.

Às vezes, nem dava graça de ver.

Era ele sozinho, lá na frente.

E todo mundo se engalfinhando 1 minuto atrás.

Mansell, Prost, Berger, Patrese, Nakajima... ah, o Satoro!

Eram outros tempos, tempos românticos.

Tempos de lealdades e deslealdades romantizadas.

Brigas e caras feias.

Que batalhas!

Que rivalidades!

Mas tudo acabou num muro, numa curva.

A F-1 nunca mais foi a mesma.

Quem pode dizer o contrário?

Rubinhos, Massas... coadjuvantes...

Protagonista, mesmo, era o Ayrton.

Brasileiro gosta é de vencer!

Segundo lugar ou último... dá no mesmo.

A gente gosta é de ser campeão!

E o Ayrton era!

É por isso que a gente não esquece dele.

Faz 30 anos hoje, mas parece que foi ontem.

Mãe, entra no quarto de novo, amanhã de manhã, e me diz que o tempo não correu, que foi tudo um pesadelo, que foi só um sonho meu.

Mãe, entra no quarto de novo, amanhã de manhã, e me diz que o Senna venceu.

Robson Cassimiro

01/05/2024

Robson Cassimiro
Enviado por Robson Cassimiro em 03/05/2024
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