Apelação ao crime.
Acabo de ler uma frase aqui no Recanto bem estranha na sua construção, dizia assim: "Coisa que faz bem é o som da ausência de barulho". Você entendeu, não quer reler antes de continuarmos? Bem, mal terminei a leitura, surpreendeu-me este raciocínio, de cujo assalto, a ele me rendi: O silêncio, que é bom e faz bem e que deveria ser louvado, sequer foi mencionado; já o som, assim como o barulho, e que deveriam ser condenados ambos, ficaram estes com todo o mérito na sentença, somente eles se tornaram conhecidos e levaram a fama, e pior, sem terem sofrido rejeição ou repúdio.
Esta reflexão que mostrei, e o fiz de propósito, foi para apresentá-lo outra, caro leitor, que só me ocorreu, depois, enquanto ainda ruminava justamente a primeira. Adianto desde já que, dependendo do olhar direcionado as duas, uma nada tem a ver com a outra.
Eis então a segunda:
Em alguns momentos eu forço a barra para tirar um texto da cachola, na maioria das vezes sai um conto com mais de uma personagem, e muitos dos que consigo arrebatar dessa forma, violentando o cérebro em favor do meu desejo, começam bem, mas, do meio para o final, a mente sofre uma amnésia repentina e o parágrafo não avança, empaca feito burro chucro, e não há como dar sequência ao raciocínio inicial. Por conta de dificuldades como esta tenho vários contos inacabados acumulados numa pasta especial.
Claro que nem todas as pessoas que escrevem experimentam semelhante sufoco!
Situações assim terríveis cansam a gente, exasperam a nossa paciência... A partir desse sofrimento aprendi que, o melhor, e para mim o mais saudável, é evitar o estupro mental e dar fim ao personagem. Mato mesmo, e a base de tiro, se me for mais conveniente. Se você não acredita que eu seja capaz de cometer um crime, agradeço ao amigo o bom juízo que fazes da minha índole, porém insisto, e confesso publicamente, para que os leitores possam entender e dimensionar pelo que passam alguns autores e escritores durante a execução do seu trabalho. A gente chega, ocasionalmente, ao cúmulo do assassinato, é verdade! Eu sou um! Se você ainda duvida, então leia a crônica "Sábado de manhã" para constatar um duplo homicídio doloso cometido pelo autor deste texto e a mera falta de imaginação ao ter que lidar com dois personagens extrovertidos que se queriam muito bem.
Foi a partir daí que me veio a empatia e compreensão pela autora que postou aquela frase - "Coisa que faz bem é o som da ausência de barulho" -, pois a ausência de barulho não é o som, e sim o seu contrário, o silêncio. Talvez eu esteja redondamente equivocado, não discutirei o assunto.
No cuidado em manter a minha boa reputação perante os nobres colegas aqui na comunidade, prometo não fazer do delito um falso trampolim para bombar a leitura das minhas histórias.