RECORDO AS CARINHAS JOVENS DOS MEUS PAIS

Recordo do meu pai e da minha mãe desde antes de eu ter dois anos do idade. Nesse tempo, minha mãe tinha vinte e dois anos e o meu pai tinha vinte e quatro. O Davi estava pra nascer já dentro da barriga da minha mãe. Recordo as carinhas jovens dos meus pais, mas no meu coração eles eram patriarcais, muito antigos, autoridades soberanas, fortalezas. Recordo eles, porém, mais nitidamente quando eu tinha quatro, cinco anos. Aos meus sete anos, meu pai tinha trinta. Ele era só um menino adulto. Minha mãe tinha vinte e oito anos. Ela era uma menina com três crianças com pequena diferença de idade entre eles. Nesse tempo, a Vera Lúcia tinha oito ou nove anos e o Davi tinha cinco ou seis.

Meu pai agora está com 81 anos, tendo ainda os cabelos pretos e a aparência um pouco jovem. Minha mãe está com setenta e nove anos, porém, ainda ativa.

Passaram-se mais de cinquenta anos e eu vivi cada um deles. Nesse meio tempo, meu irmão e irmã se foram da vida. Ambos bem jovens. Sobrou o irmão do meio - eu. O Davi, se foi com vinte e sete anos, em 1995. A Vera Lúcia se foi com cinquenta e cinco anos, em 2019. Apesar disso, como tenho ainda meus pais e ambos permanecem bem ativos e atuais apesar da idade, pensando nos poucos mais de cinquenta anos que tenho consciência da existência deles, que tenho consciência da existência dos meus irmão e irmã, bem como dos familiares e do mundo, me dou conta de quão curta é nossa vida, embora que, por um lado, ou depende do ponto de vista, possa parecer longa. Entretanto, as lembranças são todas muito nítidas, parecem logo ali, dá impressão que tudo foi ontem.

Ontem ainda, 23 de abril de 2024, procurando músicas dos filmes 007, algumas que eu gosto, me deparei com a cantora internacional Rita Coolidge e, no vídeo onde ela canta a música We Are All Alone, trilha sonora do casal romântico André e Carina, respectivamente o ator Toni Ramos e atriz Elisabete Savala, em uma novela de 1977, nesse vídeo a cantora está bem jovem e bonita, com uma aparência não muito diferente da aparência das pessoas de hoje. Embora eu já tenha 58 anos, tivemos a graça de nascer e crescer num tempo em que as gravações de sons e imagens, bem como o colorido, já eram de alta qualidade, então podemos ver pessoas em vídeos de cinquenta anos atrás como se fosse atual. Quando fui procurar o nome da jovem cantora no Google, vi que ela nasceu em maio de 1945, o mesmo ano que minha mãe nasceu. Procurei fotos atuais dela e já não tem aquele rosto esticadinho, estando com o semblante bem marcado pela idade como os dos meus pais.

Num instante tive um choque de realidade. No primeiro momento pensei que se passou muito tempo desde aquelas imagens da cantora jovem até agora. No momento seguinte, porém, me dei conta que eu vivi todos esses anos, tanto é que eu poderia balbuciar algumas frases daquela música de cor. Me voltou à memória muito nitidamente aqueles dias, quando eu tinha 11 anos, o meu romantismo latente, alguma paixão que eu tinha naqueles dias e o surgimento repentino de tantas meninas com o nome Carina que até então eu não tinha visto. Portanto, esses cinquenta anos me pareceram nada.

Essa proximidade me deu a nítida impressão que nossa vida é muito curta, nossos anos são só uma babinha - uma palhinha, uma degustação apenas. Provavelmente haverá um prato principal depois disto. Nem conseguimos ir de um século para o outro se tivermos nascido no início do século. E, veja a história, acontecimentos tão recentes estão logo ali, a gripe espanhola se confundindo com a Covid-19 e quantos anos já se passaram desta última. Parece ontem. A Segunda Guerra Mundial, vinte anos antes de eu nascer. Parece ontem. Agora se revitalizou o nazismo e o fascismo, reflexo daqueles, porém com novo inimigo a ser perseguido, não mais os judeus. O golpe de 1964, o AI 5, em 1968. O festival de Woodstock, os hippies. Tudo tão presente. O onze de setembro de 2001, cujos efeitos se percebem ainda hoje. Os 7 x 1 da Alemanha contra o Brasil em 2014. Já se passaram dez anos. Isso já é história antiga e nem nos demos conta. O que são dez anos, porém? O que são vinte, trinta, cinquenta, oitenta anos? Não são nada. Com oitenta anos recém se aprendeu a viver. E, na verdade, nem se aprendeu bem ainda. Tudo parece ontem porque nossa mente é infinita e nosso desejo pela vida e pelas oportunidades que ela nos oferece é igualmente infinito.

Que Deus nos "ensine a contar nos nossos dias (Salmo 90:12)" e possamos aproveitá-los, termos consciência de cada um deles, percebê-los e degustá-los devagar! O prato principal da vida virá depois - Jesus vai voltar em breve.