“Dai, e ser-vos-á dado”
Conta-se a história de um homem muito arrogante que, certa noite, ao ficar encurralado em sua cabana de caça por causa de uma nevasca inesperada, viu-se obrigado a acender a lareira para se aquecer. Ao mesmo tempo que iniciava o fogo, aos coices e murmúrios, pôs-se a beber uma garrafa de Vodka.
No decorrer do tempo distraiu-se e, quando se deu conta, as chamas da lareira estavam esmorecendo, quase que num clamor por mais lenha. Então, o homem, ao sentir que a temperatura ambiente caíra, como já o álcool atingira-lhe o juízo, pôs-se a negociar com a lareira:
— Maldita lareira! Quer que eu lhe ofereça mais lenha, não é mesmo? Então, trate de me aquecer! - Berrava o homem que, com seu córtex pré-frontal já totalmente inibido pelo líquido etílico, deixava transparecer toda sua arrogância, que já era exacerbadamente evidente. Passaram-se os minutos:
— Vamos! Aqueça-me! - Já então batia os dentes pela queda brusca de temperatura, enquanto as chamas na lareira mantinham-se relutantes em ceder à falta de combustível.
A miséria daquela pobre alma era tamanha que criou uma personificação da lareira, evidenciando o vazio de sua desprezível solidão. Uma orgulhosa e arrogante solidão…
A lareira não suportou. Enfim, desfaleceu-se em suas últimas fagulhas até sobrar apenas cinzas e fumaça. As trevas tomaram conta do lugar e, naquela noite fria de uma insólita nevasca, aquele homem encontrou-se mais frio que seu próprio coração. Por fim, expirou.
Se aquela lareira pudesse falar, teria dito naquela noite:
— Dá-me combustível, homem, e eu não hesitarei em aquecê-lo. Alimente o fogo e não lhe faltará nem luz, nem calor. Só depende de você! - Infelizmente, no geral lareiras não costumam falar.
Algumas índoles preferem; contudo, embriagar-se na própria arrogância a dar qualquer demonstração de dependência, reciprocidade e afeto. Então, morrem solitárias, nas trevas que elas mesmas geraram, congeladas pelo seu ascetismo e inércia emocional.
Autor: Igor Carneiro