Jorge, o Bobo
Julio Arthur Marques Nepomuceno (*)
Jorge estava entrando na adolescência, um menino ainda. Estudava, mas não trabalhava. Não gostava. Tinha poucos amigos, depois de mudar de cidade.
Para muitos, Jorge era um bobo. Riam dele, faziam comentários maldosos, e até falavam em sua cara: - você é um bobão, cara.
Na verdade, Jorge era excêntrico. Tinha lá suas mumunhas... Não era dado às noitadas, tão comuns na época. Tímido, tinha complexo de inferioridade. Sempre achava que estavam falando dele. E na maioria das vezes, estavam.
Além disso, por causa de um desvio no septo nasal, respirava pela boca. Sim, vivia de boca aberta. Isso o tornava mais bobo ainda para os outros.
Até em casa Jorge era o bobo. A mãe, dizia rindo, que ele tinha cara de palhaço. Isso doía. Jorge, estoicamente, ficava quieto. Não queria brigas. Queria apenas viver e ser feliz.
Tinha alguns amigos, mas estes não perdiam a oportunidade de tirar uma casquinha. Afinal, Jorge era bobo, todos queriam rir um pouco, queriam projetar nele as suas mazelas...
Jorge, o bobo, não tinha grandes pretensões. Queria estudar, trabalhar, formar uma família e ser feliz. Não queria ser rico, apenas viver em paz com as pessoas amadas.
Jorge tinha a esperança de encontrar uma alma gêmea...Era seu sonho, demorou, mas um dia isso aconteceu. Mas nem aí acabou sua saga. As amigas da amada a aconselhavam: -dá um pontapé na bunda desse bobo, arruma coisa melhor. Jorge sabia disso, mas continuava levando sua vida. Não revidava, mas sabia que um dia iriam se arrepender do que diziam. Afinal, o mundo dá muitas voltas...
Apesar de tudo, Jorge tinha senso de humor. Sabia rir de si próprio, nas poucas vezes em que estava com os amigos. E acabou se tornando carismático. Durante sua juventude, passou pela vida de pessoas que nunca se esqueceram dele. Naquela época, estava havendo uma mudança: aos poucos, Jorge não era mais visto como bobo, mas sim como o esquisito da turma, o cara estranho, que começava a ser respeitado. E nem se dava conta disso.
Se Jorge continuava sendo o bobo de alguns, para outros ele era uma pessoa que merecia respeito. Não prejudicava ninguém, não revidava as ofensas, sabia sofrer em silêncio, curtia suas mágoas quando colocava a cabeça no travesseiro. Mas teimava em pensar que dias melhores haveriam de vir.
Quando Jorge casou, muitos vaticinavam que o matrimônio não duraria um ano. Já dura décadas. A família aumentou, a vida ganhou novos contornos, novo colorido e ele assumiu as novas responsabilidades e usufruiu da paz e alegria de um lar abençoado por Deus.
Profissional bem sucedido, acabou se tornando um ponto fora da curva. O bobo foi esquecido, e em seu lugar surgiu o excêntrico que venceu na vida, que lutou contra as adversidades e a maldade alheia, que nunca revidou na mesma moeda. E que venceu!
Jorge tinha e tem até hoje um pensamento: não vale a pena se vingar. Dê tempo ao tempo. “Nunca perdi por esperar”, dizia ele. E não perdeu mesmo.
Jorge hoje é uma referência para muitos. Já não é Jorge, o bobo. Continua excêntrico, mas isso já não chama tanto a atenção. Dá até mesmo um charme extra para ele. O que chama a atenção é o seu caráter e determinação. Tinha uma meta na vida e conseguiu alcança-la.
Já aqueles que riam de Jorge, o bobo, não tiveram o mesmo destino. Beberam de seu próprio veneno e hoje remoem as suas frustrações. Jorge nunca desejou isso, mas constata essa realidade. Sim, o mundo dá muitas voltas.
No final das contas, perceberam que Jorge não era o bobo que pensavam. Na verdade, era determinado, e alcançou seu objetivo: ser feliz.
(*) Julio Arthur Marques Nepomuceno sou eu