MÚSICAS MARCANTES

Algumas pessoas são sensíveis ao extremo, de modo que podem se emocionar com os fatos mais corriqueiros da vida. É graças à sensibilidade destas pessoas, que o mundo conta com artistas capazes de escrever poesias e músicas que marcam os momentos mais especiais de nossa vida. As músicas são atemporais. Elas têm o poder de viajar no tempo e se perpetuarem na nossa memória. Que atire a primeira pedra, aquela pessoa que não guarde na memória uma música que a faça lembrar de algo inesquecível.

Eu nasci em uma família profundamente musical. Meu pai (em memória) tocava trombone e participava da Banda de Música da cidade de Baixa-Verde – minha cidade de origem. Meu avô materno tocava pífano e um dos meus tios tocava violão, de modo que os domingos, a casa da minha avó, era transformada em palco para verdadeiros concertos musicais. Cresci, portanto, ouvindo músicas de qualidade, uma vez que a música era um dos deleites da minha família. Minha avó cantava para eu dormir, enquanto meu pai escrevia suas próprias músicas em partitura. Posso, portanto, afirmar que durante minha infância e minha adolescência fui brindada com um repertório musical extraordinário.

Meu pai era apreciador de cantores como Frank Sinatra, Nat King Cole e Norah Jones, por exemplo. Entre os artistas nacionais, ele apreciava as vozes de Ângela Maria, Nelson Gonçalves e Cauby Peixoto – artistas com os quais realizou algumas turnês por este Brasil afora.

Hoje, quando me detenho a escutar as músicas que meu pai gostava de ouvir, percebo que elas demonstram um conteúdo que não se vê na atualidade. As músicas do passado contam uma história envolvendo poesia, emoção, sentimento. Dá prazer ouvir a voz dos cantores que têm uma boa dicção e por essa razão, pode-se entender perfeitamente sua voz e a mensagem que eles desejam transmitir.

Durante minha adolescência, começaram a surgir as bandas de rock e tanto eu quanto meus amigos éramos fãs dos Beatles – cuja música pessoas da minha geração apreciam até hoje. Este grupo passou a ser imitado por vários outros grupos em todo o mundo e no Brasil não foi diferente. Em São Paulo surgiu um grupo chamado Pholhas. Embora formado por brasileiros, eles cantavam em inglês e logo seu sucesso foi estrondoso. Na década de ouro dos Pholhas, quem não ouvisse suas músicas estava por fora do que havia de melhor no cenário musical.

Lembro-me de que aos domingos, durante as matinês realizadas no Baixa-Verde Esporte Clube (BVEC), o disco dos Pholhas só faltava furar, de tanto que suas músicas eram tocadas. Entre meus amigos, todos adolescentes, ninguém falava inglês ainda, mas a letra das músicas daquele grupo estava na ponta da língua de cada um de nós. Na verdade, ninguém sabia o que estava dizendo, mas enrolar a língua fingindo que falava inglês era o máximo.

Uma das músicas desse grupo que fez muito sucesso, tinha o título de My Mistake. Era uma música lenta, que serviu como pano de fundo para embalar o início de muitos romances no BVEC. A música parecia romântica e os casais dançavam emocionados, de rostinho colado.

Hoje, revendo a música depois de ter estudado inglês, é que percebemos que ela nada tem de romântica. Sua letra, na verdade, fala de um feminicídio. O sujeito matou a esposa e, por isso, foi preso. Em um trecho da música ele diz: eu fui mandado para a prisão / Por Ter assassinado minha esposa / Porque ela estava saindo com outro / Eu perdi a cabeça e atirei nela / Esta foi minha história no passado / E eu vou me reformar / Eu estou pagando por meu erro / E jamais serei o mesmo homem novamente.

Apesar da letra “pesada”, My Mistake tornou-se uma música marcante na minha adolescência, assim como foi marcante para os amigos da minha geração.