Tributo a Curiosidade.
Diz o ditado popular:
“A curiosidade matou o gato.”
Também se diz por aí que:
“O gato tem sete vidas.”
E quem não é gato, nem tem sete vidas, pode ser curioso?
Ou será que não?
Eu não sou gato!
Nem tenho sete vidas mortais para morrer…
No entanto, sou muito curioso…
Ah sim! Sou sim. Até demais…
E porque sou tão curioso?
Porque tenho uma necessidade visceral de entender o mundo em que existo.
E é somente por isso que sou tão curioso!
Ou será que não?
A curiosidade em minha vida faz parte de uma jornada que começou na mais tenra infância, quando eu ainda era uma pequena criança, ingênua, ignorante, e cheia de curiosidades carentes de compreensão.
Nesta época de minha vida, tudo que por mim era compreendido, compreendido era como se fosse a verdade final e “absoluta” sobre tal compreensão.
Compreender tudo como se tudo fosse “absoluto”, não era arrogância minha, era apenas a forma que eu tinha de assimilar todas as coisas ao meu redor.
Em minha defesa devo dizer que nesta época eu era uma criança com menos de 6 anos de idade.
Contudo, isso não ficou assim por muito tempo. Pois, antes mesmo de sair da infância comecei a perceber relativamente que não era bem assim que as coisas deveriam ser entendidas.
Então, de forma natural e espontânea, minha curiosidade infantil me ensinou a questionar o mundo à minha volta. Virei um “viciado” em fazer perguntas. Ai do adulto que estivesse próximo de mim.
No início as perguntas ainda eram bem “bobinhas” , afinal eu era uma criança ingênua!
Perguntava algo como:
- "Porque o Brasil foi descoberto?”
- “Ele estava coberto com o que?"
- “Como fizeram para descobrir?”
Dá para imaginar o tamanho do cobertor que em meu entendimento estava cobrindo o Brasil?
Pois é… era exatamente isso que eu entendia. Só não entendia as múltiplas interpretações linguísticas da palavra “descobrir”. Por isso a curiosidade sobre o descobrimento.
Outra curiosidade que me inquietava, era sobre a televisão, pois na minha infância ainda não existia internet e a televisão era novidade.
Então, perguntava algo como:
- “Como uma pessoa entra dentro de uma TV?”
- “Como ela faz para ficar tão pequena?”
- “Como fica em mais de uma tv ao mesmo tempo?”
Dá para perceber que na minha compreensão infantil sobre televisão as pessoas realmente entravam no aparelho televisor. Só não entendia como elas faziam isso. Por isso as perguntas “bobinhas”.
Vai dizer que você nunca se perguntou algo como isso quando era criança?
Eu tive uma infância curiosa. Eu perguntei!
E perguntei muito mais sobre muitos outros assuntos.
No entanto, com o tempo “perdi” a ingenuidade nas minhas perguntas e “ganhei” o discernimento para entender o quanto eu era ignorante.
Como consequência deste “perde-ganha” transcendi da “ingênua” 1a infância para a “ignorante” 2a infância.
E foi exatamente a minha “infantil ignorância” quem me fez ver o quanto existiam coisas, curiosamente curiosas, que deveriam ser por mim compreendidas.
Afinal, tendo eu uma mente sedenta de conhecimento, cresceu em mim um insaciável “desejo de matar”. Matar a ignorância é claro. (Este “assassinato” é permitido! Não é? Ou será que não?)
O fato é que para matar a ignorância passei a questionar as coisas mais do que já questionava.
Então, surgiram perguntas como:
- “Porque ao olhar para o final de uma estrada lá é mais estreito do que o início?”
- “Porque ao chegar no final da estrada se constata que a largura é normal e o início agora visto do final é que fica estreito?"
Ou como:
- "Porque quando eu ando aqui na terra a lua lá no Céu anda junto comigo?"
- “Porque quando eu paro de andar a lua para também?”
E foi assim que naturalmente minhas curiosidades ganharam ênfase em temas de natureza "científica”.
Todavia, na época eu não sabia qual era a ciência que me deixava curioso.
Apenas continuava curioso e fazendo perguntas como:
- "O que acontece com as coisas quando ninguém está olhando?”
- “Elas continuam existindo? Ou só existem quando tem alguém vendo?"
- “E quando estou sonhando, as coisas que vejo no sonho existem?”
Hoje eu sei que em meio as minhas infantis dúvidas “científicas”, já existiam “sementes de curiosidades” sobre o tema: “A mecânica quântica das coisas”.
E não somente isso. Pois, muitas outras “sementes” começaram a brotar, em relação a muitos outros temas.
Contudo, para realizar a colheita desta “safra de curiosidade multi-temas”, houve significativas melhorias na abordagem das questões.
Melhorias principalmente na forma de elaborar as perguntas.
Perguntas que foram recheadas com um certo grau de raciocínio lógico.
Por Exemplo:
A pergunta sobre o descobrimento do Brasil evolui para:
- “Foi Cabral quem descobriu o Brasil! Certo?"
- “Quando o Brasil foi descoberto, já existiam índios morando aqui! Certo?"
- “Então, quem realmente descobriu o Brasil? Foi Cabral? Ou foram os índios?"
- “Os livros de História mentiram ou omitiram?”
Posso dizer que estas melhorias elevaram o status das perguntas de “infantil” para “juvenil”.
E como um bom adolescente juvenil, além do raciocínio lógico, havia também uma “doce rebeldia provocativa” que se manifestava principalmente em temas polêmicos. Como religião, por exemplo.
Pois, sendo eu de origem cristã católica, tinha dúvidas sinceras sobre aquilo que me ensinavam a respeito de assuntos religiosos.
E as dúvidas eram naturalmente expressas através de perguntas de uma mente juvenil logicamente rebelde, porém, alimentadas por uma curiosidade sincera.
Então, expressava perguntas tais como:
- "Maria é a mãe terrena de Jesus, certo?”
- “Jesus é o Filho divino de Deus, certo?”
- “Então, seria Maria a esposa de Deus?”
- “E Deus tem esposa?”
- “Deus é masculino?”
- “Onde fica o Espírito Santo da Santíssima Trindade?"
- “O que está incorreto ou incompleto nestes meus questionamentos?"
No entanto, percebi que ao abordar temas como este, na maioria das vezes não conseguia obter respostas satisfatórias.
Algumas vezes, além de não conseguir resposta alguma, ainda deixava alguns adultos irritados com as questões por mim expressas.
Hoje entendo que algumas pessoas se sentem “desconfortáveis” ao serem questionadas sobre assuntos de natureza existenciais tais como: crença, religião, espiritualidade.
E porque ficam “desconfortáveis”?
Particularmente desconfio que este “desconforto” se dá principalmente em dois grupos de pessoas pelos motivos expressos abaixo:
1. Em pessoas que nunca deram atenção ao tema em questão:
O fato de se sentir inferiorizado por não saber nada sobre o tema pode levar a “perceber o vazio existencial que nela existe”.
2. Em pessoas que desenvolvem fortes convicções sobre o tema em questão:
O fato de desenvolverem também intolerância com quem tenha outra forma de pensar, entender, falar que seja diferente da sua convicção. Esta intolerância via de regra é filha da “dúvida que possui sobre sua própria convicção”.
Em ambos os casos a reação ao serem questionadas por uma mente juvenil logicamente rebelde e inexperiente seria uma impaciente irritação incomoda na alma de quem foi questionado. Ou será que não?
Enfim, questionador e questionado, certo ou errado, infantil, juvenil ou adulto, polêmicas à parte, voltemos ao processo de amadurecimento de minhas curiosidades.
Se por um lado tinha restrições em obter respostas, por outro, minha curiosidade e fome de conhecimento continuaram crescendo em quantidade, profundidade e complexidade.
E enquanto minha curiosidade crescia e amadurecia, crescia também a dificuldade em encontrar pessoas interessadas e capacitadas a responder minhas perguntas ou pelo menos tentar junto comigo construir respostas aceitáveis.
Embora essa dificuldade seja comparada a um balde de água fria para uma mente curiosa como a minha, no meu caso não! Pelo contrário, foi exatamente isso que serviu para reforçar uma capacidade autodidata desenvolvida por mim ao longo dos anos.
E com o passar dos anos, ao adentrar a fase adulta de minha vida mortal, descobrir como efetivamente colher frutos de compreensão proveniente dessa infindável colheita.
No entanto, nem todo fruto colhido é proveitoso. E por isso se faz necessário a existência de um controle de qualidade daquilo que se colhe.
Para tanto, estabeleci três “âncoras” que servem como pontos de referência para me guiar nesta colheita e impedir que eu venha a naufragar no processo.
São elas:
1. Não preciso descartar nenhuma curiosidade que venha ter.
No entanto, é certo que nunca entenderei tudo que possa ser entendido. E não terei respostas para todas as perguntas. E tudo bem! Pois é assim mesmo… Existem coisas que estão para além da compreensão do mais curioso ser.
2. Para construir uma compreensão, às vezes se faz necessário destruir outras primeiro.
Contudo, para conseguir destruir fortes convicções é necessário ter uma mente aberta a novas percepções mais ampliadas e abrangentes. É a tal “Quebra de Paradigma”.
3. Uma mente aberta NÃO é uma mente entregue a devaneios ilusórios e fantasiosos.
É extremamente necessário entender a diferença entre uma mente aberta e uma mente entregue a devaneios ilusórios e fantasiosos capazes de abalar a sanidade. Esta âncora evita seguir caminhos sem volta. E às vezes se faz necessário retornar ao entendimento anterior.
Em outras palavras:
1. Tenha HUMILDADE para reconhecer que a curiosidade pode ser maior do que a sua capacidade de compreender.
2. Tenha HUMILDADE para reconhecer que às vezes é preciso abrir mão daquilo que já havia compreendido para que se possa compreender algo mais amplo.
3. Tenha HUMILDADE para reconhecer armadilhas do orgulho que impedem de voltar atrás quando é necessário.
Enfim, HUMILDADE é a chave para não morrer de curiosidade assim como o gato
Ou será que não?