Entre Sem Bater - Crianças Infelizes
Ziraldo disse:
"... todos os canalhas foram crianças infelizes ..."(1)
Ziraldo nos deixou, deixou saudades do tempo do Pasquim e das lutas contra a ditadura. É provável que Ziraldo nunca teve experiências que o identificasse como aquelas crianças infelizes. A sua criação mais famosa, o Menino Maluquinho, era uma criança feliz e que representava uma forma de educação exemplar. A defesa de Ziraldo pelo incentivo à leitura era algo extraordinário, e que perde-se a cada dia com o avanço das redes sociais.
CRIANÇAS INFELIZES
Inquestionavelmente, a defesa de Ziraldo para que não existam crianças infelizes era enorme e, às vezes, inglória. Entretanto, sua maior criação, o Menino Maluquinho(*), mostrou que a felicidade de uma criança pode ser fácil de conseguir.
Um direcionamento que, sem dúvida, abre a mente das crianças é o incentivo à leitura. É provável que Ziraldo, quando cunhou algumas frases, defendia a ideia de que crianças infelizes não gostavam de ler.
As frases devem nos levar a pensar sobre o que estamos fazendo ou fizemos com filhos e netos em relação à leitura.
"O importante é motivar a criança para a leitura, para a aventura de ler".
"Livro: gênero de primeira necessidade".
"Ler é mais importante do que estudar".
"A criança não pode ir para o computador sem passar pelos livros. Elas devem aproveitar as dádivas que a leitura pode
proporcionar".
"Escrever é a arte mais difícil de se desenvolver".
Em suma, as crianças infelizes tornam-se adolescentes e até adultos sem educação e sem cultura. Livros fazem muita falta, primordialmente porque alimentam a capacidade imaginativa e reflexão das pessoas.
OS CANALHAS
Com toda a certeza, as chances de crianças infelizes, individualmente ou coletivamente, se tornarem canalhas(2), é enorme. A responsabilidade é, sobretudo, dos pais, dos educadores e dos ambientes que se cria para estas crianças.
A explosão desses canais digitais, especialmente entre as crianças, coloca em xeque o futuro da leitura e do gosto pelos livros. O pilar fundamental para a educação e o desenvolvimento pessoal de qualquer criança é a leitura, com livros físicos. Contudo, é admissível que a leitura através de leitores de livros digitais seja um avanço importante, mas não deve ser único.
Surpreendentemente, as redes sociais exercem um fascínio inegável sobre as crianças, muito maior que livros e brinquedos. A promessa de conexão instantânea, entretenimento constante e aceitação social as atrai como abelhas ao pólen. A tela do celular se torna uma janela para um mundo de cores vibrantes, sons envolventes e estímulos instantâneos. Estes atrativos são facilmente acessível com apenas alguns toques, enquanto o livro exige muita imaginação.
Como se não bastasse, a leitura exige um esforço maior com concentração e reflexão(3). Mergulhar em um livro significa dedicar tempo e atenção a uma única atividade, desfrutando de um ritmo mais lento e contemplativo. É preciso se concentrar nas palavras, imaginar os cenários e personagens. Desse modo, se a criança-leitora não conectar com a história de forma profunda, entra para o time das crianças infelizes.
Diante dessa dicotomia, a leitura fica em segundo plano, e este péssimo hábito começa a fazer parte dos adultos de hoje. Desta forma, o autor Ziraldo atribui a canalhice destes adultos ao pouco hábito ou distanciamento da leitura.
OS LIVROS
As crianças, imersas no universo dinâmico e interativo das redes sociais, certamente consideram livros físicos como algo chato. A gratificação instantânea das plataformas digitais destrói, completamente, a recompensa da leitura (reflexão) de um livro.
As consequências dessa mudança de hábito são preocupantes, não só pelas crianças infelizes e com problemas de aprendizagem. A leitura é fundamental para o desenvolvimento da criatividade, da imaginação, do senso crítico e da capacidade de concentração. Desta forma, sem o contato regular com os livros, as crianças questionam menos o mundo ao seu redor.
Além disso, a leitura, como uma fonte inesgotável de conhecimento e informação serve para refutar falácias e fake news. Através dos livros, as crianças se informam sobre diferentes culturas, épocas e perspectivas, abrindo espaço para questionamentos. A privação desse contato limita o desenvolvimento intelectual e social das crianças, criando lacunas na capacidade cognitiva. Por isso, déspotas e ditadores trabalham com a lógica de censurar e queimar livros que questionam o status quo.
EFEITOS PERVERSOS
Outro ponto crucial é o impacto das redes sociais na saúde mental das crianças. A comparação constante com a vida idealizada dos outros, o cyberbullying e outros comportamentos são nocivos. Desse modo, geram sentimentos de inadequação, ansiedade, depressão e crianças infelizes sem saber por quê. As crianças que passam muito tempo nas redes sociais se tornam mais propensas a se sentirem insatisfeitas. Desse modo, mesmo que tenham acesso a todas as comodidades materiais, sempre querem mais ou o que não podem ter.
É importante ressaltar que as redes sociais não são inerentemente ruins e nem a causa de muitas crianças infelizes. Entretanto, as crianças infelizes são mais propensas ao egocentrismo e a se transformarem em canalhas. As redes sociais podem ser ferramentas úteis para comunicação, aprendizado e entretenimento, desde que com moderação.
Outrossim, é fundamental que as crianças aprendam a usá-las conscientemente e com equilíbrio.
INCENTIVANDO A LEITURA
Para incentivar a leitura nas crianças, é necessário que os pais e educadores assumam um papel ativo. Algumas atitudes possíveis e fáceis de implementar incluem:
Criar um ambiente propício à leitura: Deve-se ter livros em casa, frequentar bibliotecas e livrarias. Adicionalmente, , ler para as crianças desde pequenas e mostrar o prazer que a leitura pode proporcionar.
Oferecer opções de leitura atraentes: Escolher livros que sejam próprios à idade e aos interesses das crianças. Incentivar a leitura de diferentes gêneros literários e utilizar recursos como audiobooks e e-books.
Servir de exemplo: Pais e educadores devem, sem dúvida, ser exemplos de leitores ferrenhos. Assim sendo, devem demonstrar para as crianças que a leitura é uma atividade importante.
Promover atividades de leitura: Adicionalmente, organizar clubes do livro, contação de histórias e outras atividades que incentivem a leitura e a integração.
Ao investir na leitura, estamos investindo no futuro das crianças, eliminando crianças infelizes e prevenindo o aumento de canalhas. Através dos livros, crianças desenvolvem qualidades e se tornam adultos com preparação para enfrentar os desafios do mundo.
Em suma, é importante lembrar que a leitura não precisa ser uma atividade solitária ou tediosa. As redes sociais podem se prestar para promover a leitura, conectando crianças com outros leitores, compartilhando dicas e sugestões de livros. Enfim, é através de um uso consciente e responsável das tecnologias, podemos garantir que as crianças se desenvolvam. Certamente, onde a leitura e as redes sociais coexistem em harmonia surge o desenvolvimento pleno da infância.
RÉQUIEM
E foi aí que
todo mundo descobriu
que ele
não tinha sido
um
menino
maluquinho
ele tinha sido era um menino feliz!
R.I.P. Ziraldo!
"Amanhã tem mais ..."
P. S.
(*) A história e produtos do enredo do "Menino Maluquinho" deveriam ser material obrigatório nas escolas brasileiras.
(1) "Entre Sem Bater - Ziraldo - Crianças Infelizes" em https://evandrooliveira.pro.br/wp/2024/04/08/entre-sem-bater-ziraldo-criancas-infelizes/
(2) "Entre Sem Bater - Nélson Rodrigues - A Ousadia dos Canalhas" em https://evandrooliveira.pro.br/wp/2024/01/27/entre-sem-bater-nelson-rodrigues-a-ousadia-dos-canalhas/
(3) "Entre Sem Bater - Kobe Bryant - Reflexão" em https://evandrooliveira.pro.br/wp/2023/11/17/entre-sem-bater-kobe-bryant-reflexao/