NÓS, HUMANOS
Diferente de todos os outros animais, nós somos capazes de construir (não apenas utilizar) artefatos que com o uso se tornam extensões dos nossos membros.
Desde a mais tenra idade aprendemos a usar o talher que, em última análise, é ferramenta para a alimentação.
Claro que está perfeitamente documentado em fotos, vídeos e trabalhos acadêmicos que outros animais também utilizam “ferramentas” para resolver problemas, principalmente quando precisam alcançar alimento em local onde a mão não chega, para quebrar a casca dura de sementes, como defesa contra predadores ou ataque contra inimigos da própria Espécie na disputa por alimento, território ou acasalamento.
Mas há uma diferença fundamental.
Os outros animais são imediatistas e abandonam as ferramentas depois do problema solucionado.
Nós não.
Além de guardarmos tudo, somos capazes de idealizar e construir a ferramenta própria para determinada tarefa.
Alicate, broca, parafuso, chave de fenda, martelo, prego, corda, prendedores de roupa, clips, faca com serra para pão, etc. são artefatos presentes em praticamente todas as casas e são tão comuns que não nos causa admiração sobre as suas funcionalidades e o tanto de tempo que foi necessário até que alguém chegasse à conclusão da forma adequada.
Tudo isso e muito, muito mais, é fruto da nossa “genialidade” e da eterna insatisfação com o corriqueiro, com a ideia de que poderia ser diferente ou ter mais alguma utilidade.
O canivete do exército suíço é um excelente exemplo para isso. Um sem número de ferramentas e oportunidades num único objeto.
A Neurociência, que é a parte da Biologia encarregada de estudar os fenômenos cerebrais, chegou, entre outras, às conclusões de que o nosso sucesso como Espécie se dá porque além de construir ferramentas, podemos abstrair; aprender e transmitir conhecimento; explicar as causas do sucesso ou insucesso dos empreendimentos; formar grupos com os mesmos ideais; fazer comunicação de massa e buscar o prazer pelo menor esforço.
E é nessa busca pelo prazer que reside o perigo.
É bem menos trabalhoso e cansativo assistir a um filme (ainda que com a interpretação deturpada ou não do diretor) do que ler um livro; beber suco de caixinha do que espremer a fruta; usar o carro para ir ali na esquina, do que ir a pé; comer fast-food do que preparar o alimento por horas na beira do fogão; usar joguinho eletrônico deslizando a setinha com o dedo do que resolver palavras cruzadas ou sudoku e é na busca por essa sensação de prazer que a dopamina proporciona que leva os desavisados a consumir toda gama de drogas viciantes ou se deixar escravizar pelas “facilidades” do aparelho celular, sem sombra de dúvida muito útil, mas formador de legiões de ausentes nas famílias e na sociedade.
Manter os olhos pregados na telinha do celular virou epidemia mundial.
Olhe ao seu redor, (se você puder despregar os olhos da telinha do seu celular) e observe que, pelo menos 9 em cada 10 pessoas, estão usando o celular dentro dos ônibus, andando pelas calçadas das ruas indiferentes ao trânsito com os motoristas também ligados aos celulares, nos restaurantes com o celular ao lado do prato, as pessoas se alimentam sem se dar conta do que estão comendo, os professores colocam as tarefas nas comunidades dos estudantes que “não podem” largar os celulares, a produção de texto foi substituída pelos emogis que substituíram as abreviações das palavras.
Tudo isso leva à preguiça mental, à superficialidade do noticiário e à pobreza do conhecimento geral que leva à aceitação de narrativas, na maior parte das vezes mentiras deslavadas, totalmente divorciadas da realidade.
Inibe a formação de novas lideranças e reduz as oportunidades de desenvolvimento.
Felizmente isso também passará e o nosso cérebro por ser analógico, reconhece que entre os extremos, branco ou preto, esquerda ou direita, miseráveis ou milionários, capitalistas ou comunistas, teístas ou ateus, doutores ou analfabetos sempre haverá milhões de possibilidades a serem desenvolvidas e exploradas racionalmente.