O Tilintar dos Talheres
Dia desses, amanheci. Sim, amanheci. Digo amanheci porque o dia mesmo ainda estava na noite que chegara às 18 horas do dia anterior. Portanto, eu amanheci.
Amanheci como todo o amanhecer: sendo o que é todo santo dia. E todo santo dia eu sou aquela que acorda, põe os óculos na cara e segue até a cozinha preparar o café da manhã.
Mas nesse dia, me extraviei. Parei na janela para abastecer alguma reflexão que ainda dormia dentro de mim, enquanto meu olhar captava algo no céu. Aliás, o céu é ótimo para fazer acordar reflexões.
E foi exatamente nesse intervalo que ouvi, vindo de algum outro apartamento, o tilintar de talheres: alguém havia amanhecido também. Isso significava que em seguida poderia vir o cheiro do café, ou um cheiro doce qualquer, típico das pequenas refeições.
Poderia vir vozes, talvez até uma música baixinha – há quem acorde animado. Mas, de tudo o que poderia ser, nada foi. A não ser, o tilintar dos talheres, que continuaram. O que estariam eles levando ao deleite daquele paladar? Ovos mexidos? Uma fatia de bolo feito no dia anterior?
Não sei. Mas fiquei um tempo ali a ouvi-los fazerem o seu trabalho. E pensei: nesse céu de possibilidades, me apeguei aos detalhes de outrem. Afinal, o amanhecer é sempre um momento de admiração, seja observando a natureza, seja simplesmente fazendo uma reflexão.