22 de agosto de 2020

 

17h32min

 

Os meninos e seus quadriciclos… 4 garotos em cima de 1 quadriciclo e duas mocinhas de short e biquíni com cabelos amarrados pra cima, eles estão em Miami em suas cabeças. E o garotos que jogam futebol há poucos metros da cena, pertinho do mar… Esses estão na Bahia. Mas também não são lá, grande coisa.

Às vezes eu fico com cara de bobo pensando na humanidade povoando Marte (como nos livros de Ray Bradbury) e levando umas seis toneladas de quadriciclos pra lá (a humanidade criando lugares idênticos aos daqui, com os mesmos defeitos e crises).

 

Crises… Crises… Crises…

 

Todos indo e vindo; de biquíni ou de sunga e de corpos sarados. E eu sou o cara invisível, escrevendo numa varanda.

Rico gosta de malhar, de correr na orla, de se alongar, rico gosta de boné e calça colada… E rico gosta de Gatorade, mesmo podendo comprar qualquer coisa melhor que aquela porcaria. Todo mundo já sabe que não hidrata "igual a água", mas eles parecem ter ESCOLHIDO acreditar que aquele negócio funciona. É que nem dar Biotônico Fontoura pras crianças... Como uma boa forma de introduzi-las aos destilados.

Pobre trabalha enquanto o rico faz essas esquisitices. Babás, empregadas, caseiros, jardineiros… são seres constantes e sempre presentes, vigiam suas vidas e eles nem notam… depois de um tempinho, todo mundo se esquece deles… desaparecem e reaparecem de acordo com a necessidade dos patrões. Muitas vezes esses patrões são adolescentes e crianças... Aqui é uma casa de gente correta, que foi pobre no passado e hoje não é mais. Mas acredito que em algumas destas casas em minha volta, eles tenham que servir quitutes em surubas ou coisas assim.

 

21h19min – Eu sigo escrevendo o que ninguém leu – ou leu, mas não prestou atenção – desde 1999.

 

São todos brancos também... Nada contra. Eu acho lindo mulheres brancas… pálidas, leitosas. E minha mãe é branca. Acho negras lindas também, é fácil pra mim gostar de tudo já que eu não vou querer nada. O problema é a tentativa de embranquecer o que não é – essencialmente – branco. 99% das mulheres que vejo passando são negras, mestiças, morenas (cabelos crespos, pretos ou castanhos de nascença), mas elas pintam de loiro e fazem pranchinha… ficam que nem gambás... cabelo loiro que vai escurecendo a partir da raiz. Tornam-se algo que não é branco, algo que não é negro.

 

Tornam-se uma confusão.

 

21h31min

 

Uma vez eu pedi pra minha mãe pra alisar meu cabelo. Não lembro da resposta que ela deu. Quer dizer… lembro que ela não quis, obviamente. Mas não lembro do que ela disse pra me CONVENCER... Pois eu era, e ainda sou, muitíssimo insistente quando quero uma coisa, mas no fundo… Eu não queria ter o cabelo liso. Eu só queria ser igual as pessoas do colégio… E o cabelo deles era assim. E as pessoas pretas (como eu) que eu conhecia, não tinham dinheiro... Era empregados. Muitas vezes MEUS empregados. Como me sentir parte deles? Então seria melhor se eu estudasse num colégio público? Talvez fosse o mesmo nível de desastre... no momento que descobrissem onde eu morava.

 

O problema não reside (não mais, eu acho) no fato de que o rico existe. O problema é quando a riqueza de um... depende da extrema pobreza do outro... pra continuar existindo.

 

“Mas eu sou contra essa ideologia da agonia/Sou a favor do investimento/Pra acabar com a pobreza/Sou pelo estudo e o trabalho em harmonia/O amor e o cristo redentor/Poesia na democracia!” (Jorge Mautner)

 

Henrique Britto
Enviado por Henrique Britto em 03/04/2024
Código do texto: T8034176
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