O OVO BRANCO SOBRE A MESA
Num dia desses de outrora, tempos idos que ficaram marcados na memória dados os momentos pitorescos acontecidos, um amigo escritor enviou-me a foto de uma mesa sobre a qual, além da linda toalha enfestada com belíssimas ilustrações de utensílios domésticos, tais como pratarias, travessas, xícaras e bules coloridos, se destacava a presença solitária de um ovo de galinha. " Elabore uma crônica a respeito desse ovo sobre a mesa, caso tenha capacidade criativa para fazê-lo. Fica o desafio!"
Nada mais singelo e desprovido de graça do que aquele ovo branco certamente de galinha de granja posto na solidão da imensa mesa de sala de jantar coberta pela toalha de agradável visão. Analisei a cena tosca e apagada sentindo existir somente comoção no risível daquele cenário a meu ver lúgubre. Que preponderância poderia ter sob o olhar vazio de imaginação do cronista a presença oval do produto galináceo na natureza morta representada pela mesa coberta pelas cores da toalha? Haveria algo relevante a ser dito sobre tamanha simplicidade? Aquilo, o mero do mais comum, merecia o esforço intelectual de uma crônica? Meu coração gritava que não.
Nesse caso, pobre de mim, eu me daria por derrotado ante a magnitude do desafio proposto? Afinal de contas, o ovo branco de granja na mesa não era mais que apenas isso. Contudo, tinha a casca impecavelmente limpa, em seu interior o amontoado de vitaminas e proteína aguardava ser consumido, alguém o fritaria ou cozinharia, talvez preparasse omelete, faria ovo poche, em pouco o teria em forma de sanduíche contendo cebola, alface, queijo e rúcula, quiçá um xtudo, não importa, a forma como o tal ovo iria ser consumido ficaria a critério do cozinheiro.
Seria a pessoa a usá-lo desajeitada, por isso sujaria o fogão e o chão da cozinha com respingos da clara e fragmentos da casca? Sim, decerto, porém se ao contrário fosse ela ou ele meticuloso e não bagunçasse o ambiente cuidando para nada sujar e, por conseguinte, jogasse na lata de lixo qualquer resíduo decorrente da atividade? As hipóteses variavam no uso adequado ou não do ovinho solitário sobre a mesa. Sem descartar também a possibilidade daquela coisinha branca ser levada para a geladeira e lá preservado. Era apenas um ovo, muita coisa poderia acontecer com ele. No tocante à mesa, não sairia do lugar se por mãos humanas não fosse removida. Nenhuma relevância para ela, o personagem era só o ovo.
Pronta a crônica, boa ou não, mandei-a via whatsapp para o colega escritor, cabendo a ele então aprovar ou criticar o texto. Foi o que realmente deu para fazer, considerando que um ovo branco, apenas ele, em cima da mesa não representa muito para o florir da imaginação, penso que zeros à esquerda dizem muito mais. Ele nunca falou ou escreveu nenhuma linha a respeito de minha crônica, se venci ou perdi o desafio. Nunca entendi o porquê.