RESIDIR EM EDIFÍCIO

Você nem nota, mas o tempo voa, depois de umas continhas cheguei a conclusão que trinta e cinco anos se passaram desde a última vez que fui ao mercado com a desafiadora missão de achar um imóvel que atendesse simultaneamente a dois filtros com total incompatibilidade de gêneros: preço e exigências.

A variável valor sempre foi o agente perturbador da história, pois a oferta fica de alguma forma vinculada ao poder econômico, imóveis com internalidades e externalidades positivas são objeto de consumo para apenas uma restrita parcela da população.

Desde que passei a ser responsável pelas escolhas, aprimorei filtros imobiliários, se no início a trajetória do sol, ou seja, preferir sua incidência pela manhã. Gradativamente outras questões foram incorporadas: estado de conservação das partes internas, cômodos devassados, necessidade de dois banheiros, quartos que mantenham liberdade para todos e uma vaga para veículo. E claro, quanto maior forem as exigências, menor as ofertas e custos crescentes.

Depois de desfrutar por longo período das benesses de residir em amplas casas, dotadas de terreno em seu entorno, onde colaborei para o aumento de área verde urbana, me vejo agora visitando residências empilhadas na vertical e geminadas na horizontal e que necessitam de um transporte adequado para percorrer de forma ágil esses paralelepípedos ocos, que comporta infinitos cômodos. Essa via segregada por alvenaria esconde esse veículo que permite aos moradores chegar ao seu plano residencial em uma pequena fração de tempo sem despender esforço físico.

Por outro lado, compete diretamente com a mão de obra, como os principais vilões que acabam gerando o astronômico custo mensal do condomínio. No caso do elevador, além do custo de energia, entra pesado na conta os abusivos contratos de manutenção do equipamento, por conta do cartel das empresas do setor, que mantém artificialmente os preços nas alturas.

Outro fator que interfere no valor do condomínio é o desperdício de água, pois tanto faz você ter consciência na hora de consumir esse precioso líquido, pois a conta é única, e será rateada entre o número de unidades residenciais de forma equânime.

O consumo de energia de uso comum segue o mesmo princípio da água, se você mora no primeiro ou no vigésimo andar, o valor embutido no condomínio será idêntico, independente da quantidade de moradores por apartamento.

Mesmo não vivendo em apartamento há muito tempo, me dá arrepios quando vejo zeladores usando água tratada, produzida a custo alto, para literalmente varrer dependências do prédio e ainda com mais vigor calçadas. Penso que parte da culpa, deveria ser creditada ao síndico, por nunca ter conversado com funcionários sobre a finitude de bens supostamente inesgotáveis.

Fica para o período noturno, o espetáculo dos muitos quadradinhos iluminados, ora com luminosidade monocromática, ora com sob efeito da infinita e mutante paleta de cores disponibilizada pelas televisões ligadas.

As coisas vão acontecendo, e claro, gradativamente você vai incorporando fatos que não necessariamente podem ser definidos como escolhas, até porque em família as decisões nem sempre são consensuais, valendo o que a maioria escolheu.

Alcides José de Carvalho Carneiro
Enviado por Alcides José de Carvalho Carneiro em 27/03/2024
Código do texto: T8029097
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