ALGUMA COISA ESTÁ FORA DA ORDEM

Não são poucas as vezes que me questiono, e uma pergunta sempre se repete, resgatando o benefício da dúvida, até que ponto temos efetivamente conhecimento amplo de tudo aquilo que fomos gradativamente sedimentando ao longo de nossa formação, e que nos permite afirmar hoje, num passado recente ou mesmo num mais distante, um posicionamento claro a respeito de fatos, não importando se estão vinculados a história, ou mesmo ao complexo relacionamento entre pessoas.

Essa preocupação não é recente, lembro de sempre tentar questionar verdades supostamente definidas como reais, e isso nos tempos de escola nunca me trouxe vantagem, até porque, lá nos idos anos cinquenta e sessenta, a figura do mestre não era passível de erro, professores em sua esmagadora maioria podiam ser considerados quase uma divindade.

O respeito e submissão nos meus anos de Colégio Pedro II faziam parte do protocolo escolar, que acompanhado da lisura do uniforme completo e da higiene pessoal não faziam parte da pauta de discussão, eram para serem seguidos, e ponto final.

Infelizmente vivíamos um momento de forte repressão das liberdades democráticas no país, mas, pelo menos dentro dos muros da escola, não havia intervenção militar, que tanto fragilizava o ambiente cultural, onde tudo a ser apresentado, necessariamente passava pela mão de algum censor, que daria a palavra final sobre a vida da obra em análise, gerando um aborto precoce de filmes, músicas, livros e peças teatrais.

A propaganda chapa branca antevia um futuro de glórias para a nação, que simultaneamente dava sumiço ou expulsava do país todos que não rezassem a bíblia adotada pelo governo. E foi nesse clima de hostilidade, que percorri a maior parte da minha vida acadêmica.

Esse devaneio histórico entrou na minha pauta do dia, por conta do discurso de um general de pijama proferido ontem numa mesa de bar. Impressionante como a realidade permite olhares tão díspares de um mesmo fenômeno.

Na fala do militar, a falta de discernimento da população não permite entender, e muito menos agradecer às forças armadas a manutenção da democracia, pois sem sua pronta intervenção o país teria trilhado o mesmo caminho de Cuba.

Naquele março de1964, a conjunção de militares definidos como corajosos supostamente apoiados pela população, a igreja, os políticos, a mídia e porque não os ianques, temerosos que se encontravam em função da crise gerada pela Guerra Fria, visavam impedir o alastramento de ideais comunistas no mais estratégico país da América do Sul.

No período de desgoverno do capitão, novamente a turma da caserna sentiu o gostinho do poder, e claro, quatro anos foram pouco tempo tanto para se refestelar, como para um novo golpe, sendo sempre adiado para o ano seguinte, e segundo o interlocutor, o que faltou mesmo foi atitude dos novos comandantes.

Neste 2024 a classe vai comemorar sessenta anos do golpe, com muita pompa e esperança de dias melhores para a classe, pois acreditam que nem mesmo a figura do Xandão impedirá que esses supostos patriotas retornem ao tão almejado poder, afinal gente, quatro anos de pajelança, por incrível que possa parecer, serviram apenas para abrir o apetite dessa gente fardada.

Vamos torcer para que isso tudo não passe de um sonho sonhado dessa gente que usa farda e sempre foi historicamente apegada a golpes.

Alcides José de Carvalho Carneiro
Enviado por Alcides José de Carvalho Carneiro em 27/03/2024
Código do texto: T8029080
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