CENSURA DISPENSÁVEL

Repercutiu recentemente a censura sobre o livro "O avesso da pele", de Jeferson Tenório, quando alguns governos estaduais como Paraná, Goiás, Mato Grosso e Santa Catarina mandaram recolher os livros que seriam destinados ao ensino médio.

Isso depois que uma diretora de uma escola da cidade de Santa Cruz do Sul mandou recolher o referido livro de seu estabelecimento de ensino.

Não por acaso, como se já não bastasse a atitude retrógrada da diretora, os governantes dos estados citados são de extrema direita.

A alegação é que o livro contém palavrões e cenas de sexo, como se os adolescentes e jovens do ensino médio fossem tão puritanos e inocentes assim: quase todos falam todos os palavrões disponíveis e já sabem mais de sexo do que muitos de seus pais.

Eu li o livro, que foi debatido no Clube de Leitura e não achei nada tão cabeludo assim. É uma história sobre racismo, sobre violência policial, relacionamento de pais e filhos e a qualidade (ou a falta dela) do ensino publico. Nada demais, nada que vá poluir a mente ou corromper a inocência dos estudantes de ensino médio, que, como eu já citei, não são tão inocentes assim.

Trata-se de censura pura e simples às artes, algo que pensávamos já ter sido superado. Em estados onde a extrema direita governa, ainda que é preciso lembrar que o livro foi aprovado durante o governo Bolsonaro, conhecido por suas atitudes retrógradas e autoritárias.

Ouso dizer que nem a diretora da tal escola, nem os governadores dos estados onde o livro foi recolhido leram o mesmo na íntegra, talvez só as partes "censuraveis", que certamente não correspondem nem a 10% do romance, que, entre outros méritos, ganhou o Prêmio Jabuti.

É preocupante quando algo assim acontece, por que corremos o risco de voltar ao tempo em que se queimavam livros censurados em praça pública, em uma época nem tão distantes assim.

De certa forma, o tiro saiu pela culatra, pois diante de tantas polêmicas, as vendas do livro de Tenório quadruplicaram e hoje ele está em todas as listas de mais vendidos.

Mas nenhuma forma de arte, a não ser que seja escatológica ou ofensiva, deve ser censurada. O livro O avesso da pele merece ser lido e discutido por todos os públicos, como foi debatido no Clube de Leitura da Biblioteca Pública. Toca em temas salutares como racismo, que deve ser discutido e abolido de nossa sociedade.