contrasenso
CONTRASENSO
Ofereci-lhe a minha amizade, você me virou as costas.
Olhei nos seus olhos, de mim você desviou o olhar.
Segurei a sua mão, você a puxou com violência.
Ergui-o da sarjeta, você quis continuar deitado nela.
Mostrei-lhe o caminho, você preferiu os atalhos.
Ensinei-o a nadar, você escolheu afogar-se.
Lavei-lhe as feridas, você sujou-as novamente.
Ensinei-o a poupar, você partiu para o desperdício.
Contei-lhe lindas histórias, você não as ouviu.
Falei-lhe de paz, você quis a guerra.
Ensinei-o a amar, você optou pelo ódio.
Dei-lhe boca para louvar, você selecionou a maldição.
Tirei os espinhos de seus pés, você continuou pisando neles.
Dei-lhe casa para morar, você preferiu o relento.
Pus em seu corpo roupas alvas, você as sujou.
Dividi-lhe a minha herança, você dilapidou.
Dei-lhe a noite para descanso, você não a aproveitou.
Ofereci-lhe o dia, você quis a noite escura.
Dotei-o de inteligência, você se portou como irracional.
Dei-lhe um rosto rosado e jovem, você o encheu de rugas.
Enchi a terra de vegetação, você a devastou.
Coloquei peixes nos mares e rios, você os dizimou.
Ensinei-o a preservar a vida, você aprendeu a matar.
Ergui-o da terra, você continuou cavando sepulturas.
Gravei seu nome no livro da vida, você o apagou.
Enchi-o de coragem, você se acovardou pelo caminho.
Lavei-o de toda a sujeira, você continuou com os porcos.
Ensinei-o a ter sinceridade, você escolheu a trapaça.
Ofereci-lhe descanso, você preferiu o cansaço.
Adestrei-o para agir, você quis a omissão.
Dei-lhe palavras de sabedoria, você ficou calado.
Pus irmãos na sua vida, você os desprezou.
Ofertei-lhe o céu, você optou pelo inferno.
Coloquei-lhe uma alma pura, você fez tudo para perdê-la.
Ofereci-lhe a minha vida, você nada me deu em troca.
Mandei-lhe meu próprio Filho, você o pregou numa cruz.
jose benedetti netto