A DANÇA DA PRIMAVERA
Tem dias em que eu choro porque minha primavera não é silenciosa, nela o vento não se envergonha de assobiar enquanto as folhas das árvores dançam. Minhas lágrimas regam o chão ventilado e primaveril. E qual seria o motivo primordial de meu pranto? São tantos, me gritaria a alma. Posto que chorar parece deveras com domar os traços da tristeza, dir-se-ia talvez amordaçar a angústia, amarra-la por completo e joga-la no fundo do mar do esquecimento.
As primaveras são floridas e perfumadas, mas também chegam frias e ruidosas, têm cores e aromas, trazem consigo o clamor das plantas no cio. Então por que choro se o mundo se torna mais bonito nessa estação de abundância floral e romântica? Certamente por isso mesmo, a beleza exalando doces fragrâncias mexe com as mágoas do coração provocando aquele inesperado aperto no peito. Poetas nunca seguram as lágrimas.
Embora eu não seja poeta, minha alma é. E quem consegue subjuga-la quando a avalanche explode dentro de si derrubando barreiras e forçando passagem? Alcançar os olhos para desaguar no rosto mostra o poder inigualável da lágrima. Chorar é próprio das almas poéticas, principalmente na primavera. Mas qualquer outra razão também pode resultar nos úmidos fragmentos tristes descendo pelas pálpebras. Nesse instante lacrimejar se mostra poético.