Num Museu, há memória e gratidão
Na mitologia grega, Zeus gerou nove filhas com Mnemósine, deusa grega e guardiã da memória, da qual temos poucos devotos, e também, por isso, carência de gratidão. E juntamente com a mãe, essas divindades passaram a residir no Museion, que também significa “Casa das Musas”, templo das guardiãs da memória. Esse templo também servia como ambiente e ambiência para educação do povo, ou seja, ao Museion se agregava a escola... Se as musas eram divindades consagradas às artes, congregavam, na sua residência, artistas, trabalhadoras e trabalhadores da Cultura, que, sem interesses por vis moedas, recebiam, desses espíritos, inspiração, em torno de esculturas, pinturas, artesanatos, preciosidades históricas, em ouro, ferro, cobre, prata, madeira, mármore ou telas, logo atraindo a população à visitação pública. Tais costumes também se estenderam à Roma Antiga, que passou a usar, para isso, templos e praças públicas, conservando-se a conceituação definidora de Museion. Definitivamente, consagrador foi a França, em 1793, ter criado o primeiro grande museu público, o Museu do Louvre, a partir de então, protótipo para tantos e tantos museus no mundo.
A preocupação de Zeus seria multiplicar, com a deusa da memória, musas, que, residindo no Museion, combatessem a desmemória, o esquecimento, protegendo assim a memória, como nós desejamos preservar a minha, a nossa, a tua e a vossa. Quem, aqui e agora, aceitaria perder a memória, esquecer completamente as coisas, os fatos, as pessoas, desaprendendo tudo o que aprendemos, esquecendo nossos conhecimentos? Não lembrarmos dos amigos, conhecidos e familiares, até mesmo ignorando a nossa própria identidade, sem sabermos quem somos nós e também quem sois vós? Sente-se, por tais perguntas, como é sagrada a nossa memória e por cuja sacralidade, constrói-se, como templo da memória, o Museu. Ora, fazer museu é historicizar a vida, num livro sem ponto final.
A memória bem se relaciona com a gratidão, assim como o esquecimento, com a ingratidão. Ser ingrato expressa não se lembrar do bem ou do ou dos benefícios recebidos. Aquele, que esse nobre sentimento olvida, pode praticar, em qualquer dimensão, cinicamente ingratidões. Gratidão é ter na memória aqueles que nos fizeram ou fazem o bem, sobretudo sem outros interesses. Distinga-se a memória individual, da memória coletiva. O Museu reúne as características da memória coletiva, pertencente à comunidade, à sociedade. E quanto maior a memória, maior consequentemente será a gratidão...
O Museu deve ser constantemente visitado, à proporção que haja planejada e contínua renovação. O bom Museu exercerá também sua vocação de escola, recebendo, sobremaneira, a juventude das redes pública e privada de ensino. É ideal política pública museológica acompanhar o que é patrimonial; relembrar os remotos e próximos tempos passados; admoestar crianças e jovens, em todos os níveis de ensino, realçando que o Museu tem a fundamental missão de aprender e fazer aprender que o passado explica o presente; e que o presente e o passado reluzem o futuro.
Em cada peça de qualquer Museu, na mais simples que houver, estará contida parte da historicidade do nosso povo, cuja história testemunha tempos que se foram; adequa-se ao relato da verdade; propicia longevidade à antiguidade; e, sobretudo, é mestra da vida. A cidadania, que valoriza o Museu, orgulhar-se-á, nele, da memória e da gratidão à sua existência. Enfim, não se adivinha o devir, mas o passado o prevê. Talentoso é saber relacionar, no presente, com ajuda da memória, o passado com o futuro.