CONSULTA COM O OFTALMOLOGISTA
CONSULTA COM O OFTALMOLOGISTA
Ontem, 20 de março foi o dia marcado, pelo SUS de Capão da Canoa, para eu comparecer no hospital Santo Antonio, da Cidade do mesmo nome, para consultar um médico especialista ,com a finalidade a fazer uma cirurgia nos meus olhos em razão de uma catarata que me apareceu e que se foi agravando, gradativamente, chegando hoje a níveis muito críticos cujas consequência só podem ser resolvidas mediante intervenção cirúrgica.
Uma condução da Secretária de Saude do município, de madrugada, às 5;30 horas,- acordei-me à 4:00 - recolheu-me , aqui em frente ao Pronto Atendimento da Paraguaçú, em Capão Novo.
Em lá chegando, fui para uma sala de espera a qual já estava cheia de pacientes com o mesmo objetivo.
Dada a natureza da patologia o universo dos pacientes pertencia a mesma ou quase a mesma faixa etária e portanto, todos homens e mulheres, ali presentes, igual a mim, tinham a cabeça branca.
Como a sala era de reduzido espaço era possível estabelecer um contato visual, com todos.
Quando cheguei, por costume, dei o meu costumeiro: Bom dia Senhores e Senhoras.
Recebi de volta, em alto e bom som, um uníssono Bom dia Senhor!
E uma senhora que estava sentada no meio da sala e que se apoiava em uma bengala informou-me que, no fundo havia um lugar disponível.
Agradeci e fui procurar o meu lugar.
Ao achá-lo e ocupá-lo, me dei conta que o lugar era privilegiado e que, dali eu poderia ver todos os participantes e me era permitido ouvir suas falas e suas conversas que estavam em andamento e continuaram após a minha chegada.
Uma senhora que me parecia ter mais de oitenta anos estava falando com um senhor sentado ao seu lado.
O assunto era a educação recebida por ela e por seus irmãos e por todos os seus amigos, no seu tempo de crianças e de adolescentes. Ela se referia a década de 1950.
Relatou, com detalhes, o respeito que os filhos tinham pelos pais e por toda as pessoas mais velhas, - familiares, vizinhos, professores ou amigos- com as quais conviviam.
Falou que bastava um olhar do pai para que o filho entendesse o que ele dizia e agisse, exatamente, da maneira determinada.
Caso contrário se preparasse para um longo conselho comportamental , ou um corretivo aplicado via palmadas na bunda.
Para os casos mais graves, ao invés da mão, era usada a cinta.
A senhora que tinha dado este depoimento, ouviu dos que estavam ao seu lado, confirmarem suas afirmações e dizerem:
É verdade! Era bem assim!
Continuou, a senhora, falando que na escola, antes de entrarem, no prédio, todos ficam na fila, por ordem de altura e, comandados pela professora, cantavam o Hino Nacional após o que, respeitos e ordeiramente, se encaminhava para a Sala de Aula.
Travam ao professor, com extrema educação e respeito, aprendidos em casa e entendiam que na escola deveriam aprender português, matemática, história, geografia e desenho e outras matérias , segundo o estágio em que estavam.
Novamente ouvi um sonoro: Era bem assim!
Um senhor que estava na frente dela virou-se na cadeira e entrou no diálogo dizendo:
E, a senhora se lembra da hora do jantar, à noite, quando o pai, voltando do trabalho, estava em casa e todos na mesa sentados?
O pai em uma cabeceira e mãe na outra e os filhos nas laterais, todos em silencio esperando que oração terminasse e que o pai começasse jantar para que pudessem, os filhos, também, servirem-se?
E, a senhora se lembra, que depois do jantar era servida a sobremesa e que, depois desta, todos ficam na mesa e estabelecia-se uma conversa na qual eram, contados os fatos acontecidos no dia e vividos pelos filhos, pela mãe pelo pai?
O senhor ficou em silêncio e pode ouvir como resposta um sonoro:
Era bem assim!
De repente me chamaram para a consulta. Olhei no relógio e já eram 10:30 e constatei que se tinham passado três horas desde entrei na sala.
Fiquei tão inebriado com a maravilha, com a sabedoria, com o respeito e com a educação ali manifestados, que não vi o tempo passar e lamentei que tivessem me chamado e impedirem, assim, de que continuasse ouvindo as memórias espetaculares ali, gratuitamente, relatadas.
Da sala de consulta fui para outra sala onde seria chamado para tomar conhecimento dos exames que teria que fazer e me foi impossível, retornar a sala onde estavam os “cabeças brancas” mas fiquei imaginando que eles continuaram conversando e contando vivencias de suas épocas, tão diferente da atual...
Faço este texto e o compartilho com meus amigos e com os meus 7 ou 8 leitores, para dizer-lhe que embora toda a demora, no atendimento, toda canseira por ter levantado tão cedo, foram recompensados, grandemente, pelos momentos vividos naquela sala e que me foram concedidos pela experiencia, pela educação, pela postura, pela dignidade, pela serenidade, daqueles homens e mulheres que, hoje, massacrados pela vida e pelo tempo, não perderam a alegria de remorem momentos singulares de suas infâncias e de suas adolescências.
E que, mercê da educação, recebida em casa, os transformou em pessoas de bem, cujas vidas dentro de alguns anos os levarão para o lugar do mistério eterno e nos privarão dos seus convívios e das luzes que eles distribuem, gratuitamente, com serenidade e com espetacular sabedoria.
Agradeço a Deus por ter-me permitido que, por alguns momentos, breves momentos, eu estivesse presente e pudesse ouvir a lições, os ensinamentos produzidos por aqueles e mulheres desconhecidos, entre si, pobres de recursos financeiros e de posses, mas ricos de experiencia de vida e de sabedoria e, por isto, sábios e dignos do meu respeito e da minha admiração.
(Recanto da Ana e do Erner, 21.03.2024- Capão Novo)