Encontro de amigas

— Fui ajudar Denise no consultório dela. Estava feliz por ajudar e por estarmos juntas, já que aposentada não faz nada mesmo, estava sendo útil. Ela me apresentou para os seus clientes como sua mãe e me chamava assim perto de todos, cheia de intimidade e carinho. Ouvi uma cliente dizer ao sair do consultório - "é bom que pelo menos ela sai de casa né?"- Ela falava de mim! Eu era uma velhinha coitadinha! Elas me viam como uma velhinha que precisa de ajuda para preencher seu dia. Será que eu estou velha mesmo ou é o mundo que me vê como uma velha? Afinal o que é ser velho? É aparência? Anos cronológicos? Vocês podem me ajudar?

— Eu que fui tirar uma radiografia de mão. O técnico do rx me dando as instruções para posicionar minha mão - " os seus dedinhos vão ficar todos esticadinhos e a mãozinha virada para baixo assim ó" -. Ele demonstrou com a sua mão a posição que era para eu colocar a minha mãozinha. Fiquei tão incomodada que prometi a mim mesma corrigir qualquer pessoa que falasse comigo usando o diminuitivo. Não deu outra. Fui no salão e a cabelereira -" vamos para a cadeirinha de lavar? Precisamos lavar o seu cabelinho antes de cortá-lo. - Eu, respondi na hora – “é cadeira e eu tenho cabelo". Não houve resposta e acho que dei o recado porque ela não usou mais o diminutivo naquela tarde. Saí de lá rindo sozinha imaginando que ela deve ter pensado -“velhinha chata e doidinha, tadinha". O que está acontecendo? Será que todo velho é tratado assim? Pensei que o tempo me faria livre de preconceitos, conceitos, julgamentos. Parece que errei. Você fica adulto e depois volta a ser tratado como criança? Como as pessoas veem os velhos? Afinal o que é ser velho?

—O mundo ficou mais educado ou eu estou velha para o mundo? A vida toda faço caminhadas. Agora sinto uma diferença. Toda vez que cruzo com alguém na rua recebo um cumprimento. Nas filas ou salas de espera que sempre fui, agora tem alguém para puxar conversa, contar um caso, me perguntar se estou bem... Nunca me senti assim, é como se as pessoas quisessem cuidar de mim. Eu não gosto, só me faz sentir diferente. Sinto que depois dos sessenta virei outro ser, os olhares mudaram sem que eu sinta mudança em mim. Precisamos falar sobre isto. Acho que estas vivências explicam o preconceito estrutural que não entendia o que é, porque não existe definição, é preciso sentir. Afinal, alguém pode definir, classificar o que é ser velho?

Márcia Cris Almeida

14/03/2024