Epifania histórica
Debruçado em sua escrivaninha reproduz atentamente o curso do discurso registrado em documento oficial. Ele não está preocupado com a veracidade daquele relato, tem como validação o fato de ser um documento oficial de valor histórico, não é como uma narrativa orientada por um narrador que cria uma voz e um discurso com um intento sagaz e o objetivo de dar a entender o que ele quis escrever. Não, são coisas completamente diferentes.
Pondera durante muito tempo o tipo de comentário que fará para não distorcer o fato histórico. A razão é a sua lupa e ele no caráter de pesquisador, crítico e cientista é alguém capaz de fazer uma interpretação sóbria. Não é como o leitor leigo, apenas como exemplo, que deduz, não induz do texto um sentido ou significado qualquer, conforme a sua visão de mundo, que é incapaz de separar os aspectos da obra da intenção autoral e cria para si o que o texto não disse, pois o enxerga para além do seu momento histórico e o isola do ambiente de sua circulação. Não, ele não faz esse tipo de coisa.
De fato, está isolado do mundo e por isso pode julgá-lo como nenhum outro. Seus estudos o fizeram mais capaz que qualquer um de entender o tempo, seu fluxo, orientação, progresso e revés. Enxerga quase como uma linha reta todo o processo histórico, ao menos o que é de sua competência, pois é capaz de um ato quase fantástico, porque coisas como projeção astral e paranormalidade são apenas pseudociência, que é o de afastar-se da própria consciência a ponto de conseguir enxergar a si mesmo no meio da história do mundo.
Sua alta humildade o lembra de que não é o centro do mundo ou da história humana, apenas que possui uma perspectiva avantajada e exclusiva a partir de si e seus interessantes são tão puros quanto os da academia, ele não inventa histórias, ele fielmente as relata a partir de sua perspectiva única e que por certo contribuirá com muito colocando uma obra de referência a mais no acervo do mundo e nos anais da história.
Que bom, mais uma vez, que não é como o escritor, ainda mais o que escreve sobre fábulas e fantasias, que constitui um mundo distante da realidade vivida, que cria subterfúgios e pontos de fuga usados por covardes que prezam apenas pela própria vida em busca de sobrevivência, que fantasiam coisas impossíveis de se adquirir por estarem além dos limites de suas condições, que criam pontos de apoio para sentimentos e emoções que deveriam estar fora da cogitação da situação real onde o enfrentamento é inevitável. Pensa ele, “como pode alguém viver a vida toda fantasiando?”, no que podemos concordar sem muitos problemas.