É por pretexto
O que, sinceramente, precisa de uma explicação?
O pai sem rodeios diz para perguntar à mãe, mas ela devolve para o pai a questão e a criança; a paciência concorre com a responsabilidade em um malabarismo ora verbal ora gestual, que se transmuta em um confusão generalizada. A dúvida vira discussão e nela se estabelece a briga. A criança foi esquecida.
O cliente tem uma dúvida que o vendedor não sabe responder, então este (o vendedor) chama o chefe. Ele (o chefe), antes de responder ao cliente, se desculpa pela falta de zelo, treinamento, experiência e profissionalismo do seu subordinado. Aproveitando o assunto, ele (o vendedor) acha por bem, na frente do cliente, lembrar ao chefe dos seus deveres e prioridades. Numa quase troca de favores eles afirmam as competências de seus cargos, mas isso, sabe-se-lá por que, se transforma num acirrado diálogo de ânimos à mostra sobre o zelo profissional. O cliente, apesar de impressionado, é deixado de lado.
Dois jovens dançam numa festa; funcionou a investida do rapaz depois de muitas tentativas mal sucedidas em uma noite que parecia infrutífera. De repente chega outro e lhe corta a vez ritmicamente seguindo a batida da música. É claro que se enerva, havia finalmente conseguido um par. Os dois começam a brigar, a se mostrar, ameaçar e empurrar. Um segurança para cada é pouco para contê-los, até que enfim são jogados para fora, ainda engalfinhados na sua recíproca e necessária autoafirmação. Lá dentro, a menina sem par, já nem quer mais dançar, pois seus pretendentes confirmaram que eram capazes de tudo, menos de lhe dar atenção.
Ai, ai. O que há em uma discussão que seja tão mais importante do que a questão que a levantou? Do que quem a levantou? O interesse, por certo, o interesse toma conta da situação. As pessoas, todas elas, agem por pretexto quando o interesse em fazer (ou não fazer) algo está em jogo, o jogo se transforma em competição e se esquecem os prêmios que podem estar à vista — a recompensa da satisfação se torna mais importante.
Faço porque quero e não faço porque não quero. É isso.