Palavra Franca
No escritório: fim de mês.
A mesma pessoa: você.
Tem-se o mesmo dia: hoje.
Digita-se a mesma tecla: menos.
Obtém-se o mesmo saldo: negativo.
Ouço a mesma frase: “– Num pode!”
E vem me confessar sem receios
Sua vida particular:
“– Lá in casa somo set boca:
– Eu, a muler e cinc fio.
– Os minín é tud de menó
– E a muler já tá grávida de gemos!
– Ela faz arguma besterinha prajudar:
– Lava ropa prusoto e faxina resdência de madãm;
– Mas num dá não!"
“– Pra conomizar nóis num tem nem fugão de gais:
(E vai contando nos dedos.)
– Lá é na bas do lampião, água é da cisterna;
– Se arguém fica duent!
– Remed é só com raiz de mat.
– Alugué não, que cum ajuda de Deus
– Fiz meu barrac lá na favela.”
(Tira-se o velho chapéu surrado.)
“– Procevê! E a fêra jacabou.”
“– Ês negoci de salaro mínmo!
– Reajusti qui tá dand?
– Mas num tá dand não!
– Fala se num tá? “
“– Será quês guvern num tá vend
– Qui o pob num tá nem cumend?”
“– Vistí num se fala.
– Óia eu aqui pro ‘C’ ‘V’:
– Mal vistid, mãos calejadas. . .
– Nada n’agibeira.
– Só Deus sab cumo to vivend.”
(Tira-se novamente o velho chapéu surrado.)
“– Da currupção. . .
– Tod mund fala. . . e ninguém. . .
– Faz nada!”
“– Seu dotô. . . será qui o sinhô é. . . pudia. . .
– Fazê um valizinho pra mim hoje?
– Tenho qui levar o dicumê pra casa. . .
– Aomeno o leite das criança;
– Gentgrand não. . . come quarquer coisa.’’
(. . . )
E você deixa sua impressão digital
Em uma folha branca
Com tinta vermelha
Que registra indignada. . .
A história de um povo.
– Por favor! O próximo!
Livro: Vermelho Navalha/2023.