Entre Sem Bater - Princípio Ativo

Felipe Nunes disse:

"... o princípio ativo da fake news é a mobilização. E não o convencimento ..."(1)

O pesquisador Felipe Nunes, inquestionavelmente, possui cabedal para falar, escrever e demonstrar os resultados das fake news na política atual. Desse modo, quando ele arguiu a expressão princípio ativo, o faz de maneira brilhante. Surpreendentemente, em uma breve entrevista, ele expõe o que podemos chamar de equívoco dos analistas sociopolíticos. É provável que a maioria destes analistas e compartilhadores de mentiras nem saibam do que ele está falando.

PRINCÍPIO ATIVO

Em primeiro lugar, é necessário destacar que, na maioria dos canais da mídia, entrevistadores têm qualificação muito abaixo de quem responde perguntas. Uma destas entrevistas que ouvi, até sem muita expectativa, muita coisa me chamou a atenção. A pequena frase-chave deste texto é, primordialmente, o que de mais rico obtive em todo o programa.

A definição a seguir teve uma apropriação fantástica para o mundo moderno e as redes sociais. Analogamente, o que alguns especialistas conhecem como princípio ativo dos fármacos, merece ter uma acepção adicional nos dicionários.

Princípio ativo é a substância que deverá exercer efeito farmacológico. Um medicamento, alimento ou planta pode ter

diversas substâncias em sua composição, porém somente uma ou algumas destas conseguirão ter ação no organismo.

Ainda em relação aos medicamentos, denomina-se fármaco o princípio ativo deste. Os princípios ativos são classificados

em função de vários aspectos, como: classe química, classe terapêutica, alvo molecular ou especificidade.

Fonte: Wikipedia (Português)

Sendo assim, podemos traduzir a ideia do Felipe Nunes de que as fake news são um princípio ativo poderoso, como:

Fake News é a substância que exerce um efeito psiquiátrico no cérebro com baixa capacidade cognitiva. É como um alimento para espaços vazios no cérebro, que tornam-se virais à medida que o compartilhamento(1) cresce. Como se não bastasse, possui o poder de atuar na classe química e molecular de cada neurônio, com propriedade até hipnotizantes.

A ENGRENAGEM DA DESINFORMAÇÃO

A frase-chave elucida o mecanismo e objetivo principal na proliferação de notícias falsas. Ao contrário do que se imagina, a finalidade das fake news não é convencer o público de sua veracidade. Entretanto, atende perfeitamente à proposta de mobilizar aqueles que acreditam nas tais informações.

Desta forma, essas iscas criminosas, atraem e engajam aqueles que compartilham de crenças e visões de mundo de bolhas específicas. Através de manchetes sensacionalistas, conteúdo emocional e meias verdades (ver onus probandi(2)), as fake news  vivem no mundo do FUD(*).

O CICLO VICIOSO DA MOBILIZAÇÃO

O ciclo repete-se, inegavelmente, numa velocidade assustadora e completamente sem controle. Desde que a criação se inicia e acende-se o pavio, não tem como interromper, voltar atrás ou corrigir.

Criação: a criação tem como base um tema que gera polarização e apela às emoções de um público específico.

Disseminação: Após a criação, o compartilhamento é rápido e eficaz nos teclados daqueles que defendem o texto.

Reforço: O compartilhamento gera a falsa sensação de validação, reforçando as crenças pré-existentes do público disseminador.

Desinformação: A repetição e o compartilhamento contribuem para a desinformação e a distorção da realidade. Assim sendo, torna-se impossível qualquer debate ou a apresentação e compreensão dos fatos ou versões contraditórias.

Mobilização: A indignação e a polarização, desde que a disseminação expande-se, leva a ações concretas, como protestos, boicotes e atos de violência.

A facilidade com a qual este ciclo inicia-se, recrudesce a cada avanço de tecnologia, e os modelos de inteligência artificial provam essa teoria. O princípio ativo das mentiras não é convencer ninguém, é manter a todos num nível de mobilização típicas do diversionismo. Nesse ínterim, como disse um certo ex-ministro déspota, "... passamos a boiada ...".

A ARMADILHA DA POLARIZAÇÃO

As fake news se alimentam da polarização, prosperando em ambientes de ódio e rivalidade, onde ataques e antagonismos substituem qualquer diálogo. Ao invés de promover o debate e a reflexão crítica, ocorre o aprofundamento das divisões e criação de bolhas, onde apenas uma versão prevalece.

A IMPORTÂNCIA DO SENSO CRÌTICO

Combater a desinformação exige o desenvolvimento do senso crítico que a maioria dos grupos não permite. Embora seja fundamental questionar a origem das informações, quem tenta criticar ou questionar sofre expurgos imorais. Certamente, a ética orienta a confirmação da veracidade dos fatos, antes de compartilhar qualquer conteúdo, mas isso é um quase crime. A falta de uma educação andragógica(3) para o mundo digital e midiático provoca seus efeitos perversos. A aprendizagem de como checar informações parece ser um processo supérfluo nos equipamentos dos compartilhadores de mentiras.

MULTIVERSO DA LOUCURA

As eleições municipais deste ano são um prato cheio para estudos e pesquisas que Felipe Nunes e sua teoria do princípio ativo. O TSE vai fazer uma legislação que tentará coibir o caos que se avizinha. Legislação sem fiscalização e punições compatíveis é totalmente inócua, ainda mais nas redes sociais.

Os processos ilegais, imorais e aéticos que ocorrem, desde as eleições de 2014, não tiveram ninguém poderoso sofrendo sanções. Por outro lado, a proposta de anistia prossegue e nem os canalhas mais audaciosos temem o que afirmam nas redes sociais. Como se não bastasse, plataformas passaram a proteger perfis que fazem ameaças e caluniam outras pessoas por conta da política.

Assim como o ambiente tecnológico Multiverso funciona num mundo ou galáxia de bolhas, serão as nossas eleições em 2024. De um lado o TSE tentando colocar ordem e "fiscalizar" a disseminação do ódio e da mentira. Por outro lado, alguns poucos usuários tentam combater o princípio ativo da mobilização para inverdades.

E, surpreendentemente, no meio disso tudo, a maioria da população que não sabe o que faz com as novas tecnologias. Ou, por exemplo, alguns poucos imaginando que podem conter o tsunami da desinformação e a ignorância das polarizações.

Ao compreendermos que o objetivo das fake news é mobilizar e não convencer, podemos nos tornar mais resilientes à desinformação. O desenvolvimento do senso crítico e o diálogo construtivo são armas essenciais para combater a proliferação de mentiras.

NÃO SE ESQUEÇAM

Enfim, só nos resta indicar alguma sugestões para que se pratique a cada segundo nas redes sociais:

Nem tudo que você lê online é verdade.

Verifique a fonte da informação antes de compartilhar.

Busque fontes confiáveis e imparciais.

Seja crítico com o conteúdo que você consome.

Ajude a combater a desinformação: não compartilhe mentiras ou até mesmo meias-verdades.

O multiverso da loucura chegou, ninguém quer mudar o pensamento de ninguém com fake news, só te mobilizar, acordem !

"Amanhã tem mais" ...

P. S.

(*) FUD, acrônimo do inglês Medo, Incerteza e Dúvida. Adicionalmente, despertam a indignação e a raiva, impulsionando o compartilhamento e a disseminação da mentira.

(1) "Entre sem bater - Felipe Nunes - Princípio Ativo" em https://evandrooliveira.pro.br/wp/2024/03/01/entre-sem-bater-felipe-nunes-principio-ativo/

(2) "Entre sem bater - Leonard Nimoy - O Compartilhamento" em https://evandrooliveira.pro.br/wp/2024/02/28/entre-sem-bater-leonard-nimoy-o-compartilhamento/

(3) "Onus Probandi - Falácias e Sofismas" em https://evandrooliveira.pro.br/wp/2018/05/05/onus-probandi-falacias-e-sofismas-10/

(4) "Entre Sem bater - Malcolm Knowles - Andragogia" em https://evandrooliveira.pro.br/wp/2024/02/29/entre-sem-bater-malcolm-knowles-andragogia/