" PARA TU

 

A vida sem cobranças

Suave como esata noite

Inventaremos cidades e trocaremos

seus postes por gingantescos

girassóis

e árvores que gesticulam

como bonecos de posto de gasolina

Seremos riso e beleza

Tocaremos os sinos em horas

flexíveis

Levaremos sopros vitais

para todas as direções

 

Vem cá, meu bem que é bom lhe ver "

 

 

 

 

 

NÃO CONSIGO FECHAR A JANELA

 

 

Estou na cama deitado e contemplo aquela janela aberta. Ela que é a metafóra do amor, do gozo da vida e da nudez da alma. A  alma que não se alimenta de pão, a alma que come beleza, e ainda que saciada, nunca resta satisfeita.
Começa a chover, mas não consigo fechar a janela. E por que não consigo trancar essas vidraças do coração? Porque a chuva é a lágrima que sufoca o peito como uma pata de elefante e a descer das janelas da alma como fogo a orvalhar a face da solidão.
Todavia a chuva não consegue esconder o céu mais belo. Adélia Prado (sempre ela) diz que " o céu será igualzinho a essa vida, menos uma coisa: o medo...". E o que é que provoca o medo, se não uma dor pretérita a ferir como uma espada do tempo?
Pro futuro não é possível prever a dor e nem evitar o medo, mas é necessário acreditar que há uma possibilidade de ser feliz, a despeito de todas as nuvens carregadas de dores e lágrimas. Após a chuva, sempre descortina-se uma luz que possibilita novamente sorrir,  mas não é possível se fecharmos a janela. E como disse o poeta Cummings, "ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas".
Com a janela aberta, feixes de luz ao amanheder desnudam a alma para libertá-la dos grilhões dos medos. O sol acaricia como galhos que frutificam paz e calmaria. As raízes se despredem da terra mal cultivada para alçar vôos de esperança em terra firme e abraço abrigo.
O amor não pede sacrifícios e nem toma nada além de si. O amor só pede para viver, nossos medos e receios é que são os cárceres da madrugada. É necessário render-se ao amor para amanhecer com o coração leve e alado.
Nas pontes de Madison, o amor sucumbiu por não se abrir a janela (porta) do carro. No quarto, nem a tempestade do medo, da solidão e da desesperança, me farão fechar a janela.
A chuva que molha, a escuridão do tempo que não passa, o medo da madrugada e o frio da solidão, podem durar todas as noites, mas eterno mesmo só é o amor.
Não consigo fechar a janela... E quem sabe a tristeza não seja apenas um intervalo para uma nova felicidade.

 

TEMPESTADE E CALMARIA

 

 

Há um belo que é visto,
e outro,
que os olhos apenas sentem...
Essa beleza oculta,
apenas no peito e na alcova revelada.
Se o que tens me pertence,
e o que não tens me procura,
deixa que o açude como beijo molhe
essa loucura do alto contemplada.
Sinta o escândalo dessas mãos
a queimar tuas brasas
com a fome e o fogo que alimenta,
mas não sacia,
porque sempre depois dessa calmaria esperada,
vem sempre outra tempestade de desejo.

 

 

 

 

 

Tarcisio Bruno
Enviado por Tarcisio Bruno em 28/02/2024
Reeditado em 02/04/2024
Código do texto: T8009375
Classificação de conteúdo: seguro