BLOCO DO EU SOZINHO
Como é tempo de folia, ontem, domingo de carnaval, achei oportuno sair de casa para espairecer as ideias e fui dar um rolê no Centro de São Paulo, com o intuito de espiar alguns blocos carnavalescos. Lá fui eu trajando a minha roupa do dia a dia, sem largar a inseparável máscara cirúrgica, ainda morro de medo da maldita Covid-19!
Por causa do calor de 40 graus e por me considerar um jovem idoso de 71 anos, achei por bem encurtar o itinerário: comecei pela Avenida São Luiz, passei pela Praça da República, fui até a Avenida São João, depois entrei na Rua Xavier de Toledo. Durante o percurso entre os blocos desfilantes, me deparei com um quadro desanimador: o som, primordial num bloco carnavalesco, não existia, pelo menos no momento em que passei não avistei nenhum carro de som, vi apenas foliões em suas, improvisadas fantasias, desfilando para baixo e para cima, como se fossem zumbis caminhando a esmo numa feira livre, muitos deles portando uma latinha de cerveja na mão e um baseado na outra, e aquele cheiro de esterco de cavalo queimado no ar, a fumaça da marijuana exala esse cheiro estranho. Algumas minas, fantasiadas de coelhinhas, já mamadas, faziam xixi na rua, não por falta de banheiro químico, e em pé, pois se fizessem agachadas não teriam forças para se levantar de tão cambaleantes que estavam.
Chamei muito atenção pela máscara cirúrgica que portava, muitos dos foliões acreditavam ser eu um médico do SUS atendendo no meio da multidão, não por ignorância, mas pela pobreza do órgão governamental em não fornecer jalecos aos plantonistas, é comum o médico do SUS atender o paciente usando apenas uma máscara, luvas nem pensar, são artigos de luxo.
Longe de ser homofóbico, apenas faço o registro, trombei com muitos gays se beijando, homens 80%, é uma questão de gosto, quanto as mulheres se beijando na boca, achei um ato inteligente e de muito bom gosto, na minha adolescência descobri que beijar mulher na boca era bom demais da conta.
O bicho só pegou mesmo foi quando cheguei em frente ao Theatro Municipal, e me saltou um folião, ou foliona, não deu para identificar o gênero, não tinha mais de 16 anos, fantasiada de libélula, nádegas e seios de fora, usando apenas um tapa-sexo, e numa crise de histeria tentou me agarrar à força e arrancar minha máscara, talvez até me confundindo com Michael Jackson ressuscitado ou algum médico do SUS, tão chapada que estava.
Foi aí que pensei nos tais processos por crime de pedofilia ou por importunação sexual, entrei em pânico e saí correndo desesperado, buscando refugiar-me em casa e botar a cabeça fora da toca somente na quarta-feira de cinzas, e pedindo a Deus para não responder pelo crime de transfobia por não ter abraçado a binária ninfeta e sim fugido em disparada do local do fato ocorrido. Consultando um jurista amigo, ele foi taxativo: como a justiça deixou de ser cega e tornou-se capenga e injusta, um processo por crime de transfobia, subindo ao Supremo Tribunal Federal, irei depender muito da decisão monocrática do excelentíssimo senhor ministro julgador no memento de proferir a sentença condenatória. Se le estiver de bom humor pegarei uma perpétua, dependendo da minha ideologia política pode ser aplicada a pena capital, trocando em miúdos, não tenho escapatória. Ai, Jesus!
Autor: Benedito Morais de Carvalho (Benê)
São Paulo ,domingo de carnaval de 2024