Preocupação extravagante
Ando triste, macambúzio, deprimido e mais alguns termos que a língua portuguesa me proporciona para uso em situações como essas. Ando é modo de dizer, pois desde que soube da terrível notícia não tenho vontade nem de sair de casa. Perdi o apetite, desencantei-me das coisas belas da vida. Leio jornais compulsivamente, todos os que consigo comprar e os que me franqueiam livre acesso via internet, mas meu coração continua apertado. Os amigos me chamam para sair e prefiro ficar aborrecido sozinho. Já não tenho tempo para mais nada. Aliás, tempo pra quê?
Vocês já devem estar sabendo: os cientistas de uma universidade do estrangeiro disseram que a Terra será engolida pelo Sol. É o seguinte: um dia, o astro rei vai se transformar num terrível devorador de planetas e vai comer todos os mundos à sua volta, isto é, nós, as estrelas, os satélites, os cometas e até a poeira cósmica. Nós e muito mais, todos os astros que se atreverem a se colocar à sua frente — ou na sua órbita, como queiram. É o fim do mundo tal como o conhecemos e que alguns aprenderam a admirar e a amar. Sim, nem todos tiveram a sensibilidade suficiente para ver a formosura que nos cerca e da qual fazemos parte, mas muitos foram os que se dedicaram a estudar e cuidar do que nós acostumamos a chamar de “nossa casa”. Agora, não adianta chorar o leite derramado, o que tiver de acontecer, acontecerá.
Quando virá a hecatombe? Quando os fatos apocalípticos anunciados vão se confirmar inadiáveis e derradeiros? Qual será nossa data final neste belo planeta? Ainda não há consenso, mas admite-se que isso pode ocorrer daqui a cinco bilhões de anos. Fazendo aqui uns cálculos rápidos, isso daria para o Brasil repetir mais de dez milhões de vezes sua história, considerando apenas o desenrolar da trajetória percorrida entre 1500 e os dias de hoje.
Se isso serve de consolo, acho que nosso território não aguentaria tanto tempo, pediríamos arrego bem antes. Já imaginaram a floresta amazônica tendo de suportar mais 500 anos de queimadas, desmatamento e poluição por mercúrio devido à presença do garimpo? Pobres dos indígenas que habitam essa região há milhares de anos. Já pensaram no estado de nossas praias tendo de aguentar mais 500 anos de descaso, de poluição, de música alta, de microplásticos misturados na areia e no nosso sangue, sem falar do despejo de esgoto? Cá entre nós, já imaginaram nossas cidades daqui a uns 500 anos? Será que todo mundo terá sua casa própria, trabalho, escolas, postos de saúde, lazer? É, acho que não vai dar para esperar sermos engolidos pelo Sol. Ou tomamos algumas providências urgentes ou a espera da solar deglutição será lenta e dolorida. Além de extravagante, esta é uma preocupação embaraçosa, não é?