Série – Curiosidades Literárias – Cap.#10 – Crônica: “Tarsiwald, o primeiro casal “shippado” em 1926” – Renato Cardoso

Fonte: https://entrepoetasepoesias.com.br/2022/11/09/serie-curiosidades-literarias-cap-10-cronica-tarsiwald-o-primeiro-casal-shippado-em-1926-renato-cardoso/

Estava numa turma de sétimo de ano corrigindo exercícios (prática comum na vida de um simples professor). Aparentemente, tudo estava normal. Conversas dentro dos limites do tolerável, algumas poucas risadas, mas todos fazendo o que tinham que fazer.

Sempre ministrei aulas de Língua Inglesa, assim como Literatura e Redação, mas neste caso estava dando aula de Inglês mesmo. Atrás de mim, duas meninas falavam baixinho: “Você shippa eles?” e a outra respondeu: “Muito”.

Mais uma palavra aportuguesada, shippar. Você, leitor, sabe o que significa? Shippar trata-se do ato de torcer pelo relacionamento amoroso de alguém, onde normalmente você une fragmentos dos nomes das duas pessoas, formando um novo nome.

Virei para elas e disse: “Vocês sabiam que shippar um relacionamento não é modinha de hoje?”. Elas não acreditaram, disseram que é coisa dos jovens. Refutei e disse que poderia explicá-las. Elas riram e acenaram com cabeça como se permitissem a alguém a explicação.

A turma ficou curiosa e todos ficaram em silêncio, também queriam saber. Então, comecei: “Vocês sabem quem foram Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral e Mário de Andrade?”. Só Tarsila foi respondida, vagamente, devido as aulas de artes.

“Oswald de Andrade foi um grande poeta e escritor brasileiro, fundador do Movimento Antropofágico junto a Tarsila do Amaral. Foi um dos vultos mais polêmicos da Semana de 1922. Já Tarsila foi uma artista plástica brasileira, autora de “Abaporu”, quadro mais famoso dela” – comecei.

Eles lembraram do quadro, mas ainda não conseguiam ligar o que os dois tinham a ver com a expressão shippar. Expliquei.

“No ano de 1926, os dois se casaram. Um casamento muto celebrado, mas que começou um tanto quanto diferente. Oswald, desejoso em casar-se com Tarsila, foi até Roma falar com o Papa para que o mesmo anulasse o primeiro casamento dela” – prossegui.

Eles ficaram meio espantados com o ano. Afinal, para eles um fato acontecido há um mês já é bem antigo, imagina em 1926! Também não entenderam muito bem o porquê de ele ter que ir até o Papa pela anulação, pois para eles bastava pedir a separação. Procurei não entrar nestes detalhes.

“Mas ainda temos a figura de Mário de Andrade, sabem que é?! (a resposta foi não). Mário foi um dos principais poetas da Semana de Arte Moderna de 1922. Autor de “Macunaíma”, entre outros… Foi ele o responsável pelo ato de shippar o casal Oswald de Andrade e Tarsila do Amaral” – relatei.

E você, leitor, sabe que foi o nome dado por ele ao casal? A mesma pergunta fiz a eles e diversas respostas foram surgindo. Pude perceber que realmente eles ficaram interessados. Então, pedi que pegassem os celulares e pesquisassem.

Um menino, no fundo da sala, foi o primeiro a dar a resposta: “Tarsiwald”. Fiz sinal de positivo para ele e eles começaram a comentar sobre o nome dado. Muitos riram e falaram que era muito feio, mas que ficou melhor que “Oswalsila”.

Ainda continuei a explicação, dizendo que o casal, mesmo com todo esforço feito, ficou casado só por três anos, quando Oswald de Andrade pediu separação para ficar com Patrícia Galvão, a Pagu.

Trinta minutos se passaram e precisava retornar a aula. Eles queriam saber se shipparam o novo casal, mas disse que era assunto para uma outra oportunidade.