ODISSÉIA TURÍSTICA

Vou levar adiante uma espécie de diletantismos típico de pessoas com idade mais avançada, mas apenas para recordar, como era bucólica a vida que se levava nos anos sessenta e setenta.

Foi ontem na volta de Cabo Frio para o Rio, utilizando um pouco de tecnologia a meu favor, me baseie do Wase para tentar minimizar os problemas típicos de um retorno pós feriado na denominada Região dos Lagos.

Em termos gerais, ambas as vias de retorno apresentavam problemas e o tempo de viagem se assemelhava, então optei pela estrada mais antiga, a Amaral Peixoto, ou RJ 106, para quem sabe assim recordar tempos idos, quando a exceção de pequenos núcleos urbanos como Bacaxá, Araruama, Iguaba e São Pedro da Aldeia vinham quebrar a monótono cenário verde das matas adjacentes a via, ou então, quando de repente surgia aquela imensidão azul da tranquila e super salgada lagoa de Araruama, que ora se transformava em um branco acinzentado do geométrico desenho das salinas às suas margens, decoradas com vigorosas rodas de vento e rústicos depósitos de sal, que se faziam presentes, logo que se chegava a Araruama.

Lá distante, do outro lado da lagoa, praticamente deserta, podia se avistar Praia Seca, uma estreita e ressequida faixa de areia que separa a quase interminável praia da Massambaba, da lagoa, onde o prédio e a fumaça da chaminé da Companhia Álcalis transformava conchas em barrilha. Nessa época ninguém pensava em poluição ambiental, e a empresa era sim, a maior geradora de diversificados empregos, além da principal fonte de arrecadação de impostos do então município de Cabo Frio.

Uma viagem a Cabo Frio exigia do interessado muito vigor, independente se o meio de transporte fosse particular ou coletivo, cada um contando com seus prós e contras. Aos mais jovens vou relembrar que a ponte Rio X Niterói só foi concluída em 1975. Até então, o serviço de transportes de passageiros entre as duas cidades podia ser considerado exemplar, principalmente durante o dia, só à noite a frequência das barcas caía.

Depois de atravessar a baía, o turista ainda precisava caminhar algo com vinte minutos para chegar à rodoviária local e finalmente ter a sorte de encontrar assento disponível na próxima saída para Cabo Frio. Algumas vezes, valia à pena embarcar em um ônibus com destino a Araruama, e lá, embarcar em um coletivo regional que te levava ao destino final.

Para aqueles privilegiados, que na época dispunham de veículo, o martírio começava já na Praça XV, onde filas quilométricas se formavam, e exigiam doses maciças de paciência para aguardar o embarque em qualquer das duas empresas (Valda e Cantareira) que na época disputavam o mercado.

Meu trecho favorito da viagem era transpor a Serra do Mato Grosso, que servia de limite geográfico entre os municípios de Maricá e Saquarema. Pelo lado de Maricá, árvores frondosas formavam uma espécie de túnel verde dando as boas vindas ao viajante. Naquele período caminhões se arrastavam para galgar essa montanha, que apresentava raros espaços para uma possível ultrapassagem, assim, se você fosse sorteado com um caminhão ou mesmo um ônibus mais velho a sua frente, sua permanência na estrada ganharia mais uma hora de duração.

A imprevisibilidade de tempo de viagem entre as duas cidades fazia parte do contexto, que era então, logo esquecida, quando você tocava com os pés aquelas ofuscantes e sonoras areias da praia do forte, que combinavam, e como, com aquelas gélidas, translúcidas e muito salgadas águas que afloram naquela região, fruto do fenômeno chamado insurgência.

O crescimento descontrolado da ocupação urbana deixou poucos trechos com cobertura vegetal preservada. Já com relação à lagoa, essa foi ultrajada de muitas formas, aterros clandestinos ou mesmo oficiais reduziram sua extensão, vale lembrar que a legislação define salinas como área da lagoa, portanto se desativadas deveriam ser incorporadas ao meio líquido, mas não é isso que a realidade nos apresenta. O despejo de esgoto in natura aliado ao assoreamento do canal de Itajuru, quase matou a vida lacustre, felizmente o tratamento primário e a desobstrução do canal tem conseguido oxigenar suas águas e recuperar pelo menos em parte a vida nesta extensa área líquida.

Agora, depois de todos os melhoramentos viários, é possível chegar a Cabo Frio em apenas duas horas, claro que fora do verão ou a combinação de feriados prolongados. Nesses momentos tudo faz lembrar o passado, pelo menos pelo fator imprevisibilidade do tempo de viajem. Ontem mesmo, uma quinta feira após o carnaval gastamos quatro horas para chegar a casa.

Alcides José de Carvalho Carneiro
Enviado por Alcides José de Carvalho Carneiro em 17/02/2024
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