MINHA RUA
Acho que hoje, poucas são as pessoas que podem desfrutar do luxo de vivenciar in loco sua rua, principalmente se residem no núcleo de uma região metropolitana. Não tenho ideia do contingente de logradouros com a característica de uso exclusivamente residencial unifamiliar, sem saída numa ladeira pavimentada de paralelepípedos, mas devem ser poucas.
Na minha rua, moradores em sua maioria, a cruzam como motorista. Pedestres têm como característica comporem a mão de obra que serve esse privilegiado estrato da população da cidade.
Minha família deve ser considerada excêntrica para os padrões vigentes, pois circulamos preferencialmente a pé, eventualmente trocamos de categoria, mas somos essencialmente pedestres.
Para o pessoal que faz segurança da rua isso deve também soar estranho, pois entre residentes, apenas conosco, eles conseguem alguma comunicação oral, com a maioria dos moradores, vale os consagrados e universais sinais manuais, positivo com o polegar ou o aceno de mão inteira, visível apenas nos carros que ainda não incorporaram aqueles escuros filtros na parte envidraçada dos carros.
Outra diferenciação vem de nossa permanência na calçada durante momentos de varrição, lavagem de nosso veículo, poda da era que reveste o muro ou do hibisco colibri que se debruça sobre ele.
Nessa manhã, trabalhando duro, de forma independente, eu e Soninha permanecemos por um bom tempo na calçada de casa. Enquanto me dedicava à faxina do carro, começando pela aspiração de poeira e detritos do interior do veículo. Em seguida, dei vida nova às partes emborrachadas do interior do carro utilizando glicerina. Depois, removi a cola dos protetores solares do para brisa. Posteriormente apliquei silicone nas partes plásticas, que hoje prevalecem no interior dos veículos. Finalmente, com uso exclusivo de água, concluí a limpeza da lataria. Logo, fica fácil entender que foram horas de contínuo trabalho.
Enquanto isso, Soninha conseguia dar uma organizada na garagem, que costuma aqui em casa, ser o último estágio para objetos, antes de serem doados ou entregues à companhia de limpeza da cidade.
Nesse ínterim oferecemos um colchão, em bom estado, a um funcionário de outra casa. Ele não demonstrou interesse, mas poucos minutos depois, acompanhado de um dos seguranças, desceram a ladeira carregando o avantajado modelo Queen com os braços.
A arrumação dessa dependência continuou, agora eliminando sobras de vidros, gesso e algumas estruturas desgastadas, que tomaram o caminho da rua. Essas saídas permitiram espaço livre para organizar sobras de revestimentos, que serão úteis em outra casa.
Concluída essa fase, partimos em direção a um desafio mais complexo, arrancar da interseção da rua com o meio fio uma vegetação que insiste em crescer vigorosamente. Enxada em punho, foi dada a largada para a batalha campal, impressiona como essa gramínea consegue se enraizar, dificultando sua eliminação. A quantidade de material retirada (terra e plantas) conseguiu encher três sacos daqueles de cem litros, que mal tínhamos capacidade de deslocar da rua para a calçada.
Nesse ínterim, saudamos a passagem dos poucos moradores que conseguimos manter alguma relação de convivência. Para nossa surpresa, até mesmo o responsável pela administração da parte baixa da rua se aproximou, para criticar a postura de alguns proprietários, que insistem em tentar implantar atividades incompatíveis com a legislação urbana do logradouro, de exclusivo uso residencial unifamiliar.
Volto ao início do texto, quando relato que são poucas ruas que permitiriam aos residentes ficar tanto tempo com portões abertos e interrompendo parte da calçada para circulação de pedestres, que claro, aqui não impediu a passagem de nenhum transeunte.