O estagiário
O estagiário tinha 55 anos. Até aí, tudo bem. Nunca é tarde para começar, dizem. E eu concordo com essa afirmação. Afinal, quem tem o direito de dar prazo de validade aos sonhos alheios?
Valtinho nunca teve problema em contratar pessoas mais velhas. Depois que ele morou no Japão, sua mente sempre priorizou os profissionais mais velhos, fluindo assim na contramão das manias ilógicas dos empregadores brasileiros.
Macedo, o tal estagiário, mostrou-se competente e dinâmico, o que não causa surpresa em mim, por exemplo. Ora, estamos falando de uma pessoa com 55 anos! Nessa idade, a barra de loading da vida ainda está no começo! Não estamos falando de um pé de jacarandá de 200 anos ou de uma tartaruga de 150 e sim de um homem produtivo, competente, dinâmico e esperto de 55 anos!
Prova disso foi o convite feito por Macedo ao seu chefe, Valtinho, de 25 anos.
- Vai ter um bloco de carnaval lá no bairro! Vamos nessa?
Valtinho tinha alma de 300 anos. Fosse um carro, ele viveria correndo a 10 km/h e olhe lá. Ao contrário do Macedo que mesmo tendo mais que o dobro da idade do chefe, pulsava vigor, energia e vitalidade. Tanto que o convite foi feito uma semana antes da folia começar.
Demonstrando a alegria de uma lesma com câimbra na panturrilha direita, Valtinho compareceu à festinha. Claro que Macedo gostou. E não era puxa-saquismo. Era uma verdadeira amizade. Afinal, o estagiário nunca teve filhos e considerava Valtinho como um parente próximo. Mais do que isso. Era quase um filho.
Para ficar melhor, Macedo iria apresentar sua nova namoradinha. O diminutivo é cortesia do carinho. A digníssima também tinha 55 anos. E segundo o estagiário, ela era a personificação do fogo. As histórias envolvendo a namorada eram muitas. Todas com direito a estripulias juvenis, dignas de quem está com o desejo a flor da pele.
A última aventura aconteceu na semana anterior. Valtinho e a dondoca resolveram namorar no carro, numa rua movimentada, debaixo da luz do poste, para irritação dos policiais que passavam numa patrulhinha e flagraram o ato. Não deve ser fácil namorar num Celtinha que mal cabe as sacolas cheias de compras de mês do supermercado, mas eles conseguiram.
Lá pelas tantas, e já com muitas doses de caipirinha no juízo, Valtinho foi chamado para conhecer a digníssima do estagiário.
- Cara, ela não sabe que eu lhe conto as nossas aventuras, hein! Bico fechado! – advertiu Macedo.
- Pode deixar! Vou fingir que estou diante de um casal de santinhos! Olha, feche essa camisa! As marcas dos arranhões estão a mostra! Do que você a chama mesmo?
- Tigresa, dona das garras de fogo! Olha ela aí! Querida, quero lhe apresentar um amigo!
Quando ela se virou, Valtinho congelou e só acordou no CTI.
Tigresa era Maria Leona, a recatada e viúva mãe dele.
O mundo animal é pequeno, não?