História de Carnaval (2)

Nem mesmo os profetas resistem ao Carnaval. Em Salvador, durante passagem de um bloco, uma cantora “previu” que o arrebatamento - aquele evento aguardado pelos evangélicos, em que Jesus descerá dos céus para buscar os convertidos - “tem tudo para acontecer entre 5 e 10 anos”. Como ela sabe? Ninguém faz a menor ideia. Um evangélico certamente dirá que Deus a avisou. Mas como foi isso? Por e-mail? mensagem do Whatsapp? De forma subliminar mediante alguma dancinha do TikTok? Não ficou claro.

A profeta ainda deu aquele alerta:

- Procure o Senhor enquanto é possível.

Onde procurar o Senhor? Somente nas igrejas, segundo os evangélicos. Mas e aquela conversa de que Deus é onipresente? Ninguém toca no assunto por causa da possível contradição.

A cantora-profeta usou do microfone para passar uma mensagem religiosa. Ela provavelmente se sentiu “obrigada” a levar o “evangelho” para aquele lugar onde estariam os que “caminham para a perdição”. Há evangélicos que enxergam o Carnaval como festa do diabo. Portanto, os supostos enviados de Deus precisam salvar almas durante as festas. É por isso que não é insólito encontrar evangélicos distribuindo folhetos com mensagens cristãs durante os festejos carnavalescos.

Alguns apenas dizem:

- Jesus te ama!

Outros tentam convencer a pessoa para frequentar a igreja deles:

- Vamos, irmão. Jesus tem um bom futuro para você! Não fica nesses locais de perdição, não! O mundo é do Inimigo.

Certa vez, conversei com um desses irmãos. Ele praticamente estava me obrigando a ir para a igreja dele.

- Olha, não estou interessado. - eu disse.

- Não se deixe levar pelas amizades. - ele retrucou. - Depois, você vai estar salvo. Eles, não. Bebida, festa… tudo isso é tentação do diabo. Não caia nessa!

Há pessoas bem-intencionadas querendo genuinamente “salvar pessoas”. Com essas, vale o diálogo. Outras, no entanto, possuem segundas intenções por trás da suposta mensagem de salvação. Intenções pecuniárias. Grandes igrejas adotaram o modelo empresarial em que o pastor e o “obreiro” precisam bater metas - isto é, trazer fiéis para a pretensa casa de Deus. A alma salva acaba equivalendo a um “bônus” no fim do mês.

Agora, uma tese mencionada antes merece um pouco mais de abordagem. Estou falando do Carnaval ser supostamente uma “festa do diabo”. Muitos crentes imaginam o diabo como um grande vilão, o “Inimigo”, que maquina nos bastidores para levar o máximo de pessoas possíveis para o inferno. Mas vamos levar em consideração não esse diabo, e sim aquele que aparece no Livro de Jó: como um funcionário de Deus. Talvez Deus tenha feito uma outra aposta com o diabo. Uma aposta que não apareceu em nenhum dos ditos livros sagrados. Cabe ao cronista imaginar como foi:

- Senhor, quer apostar que basta um estímulo para que seus servos deixem de te servir? Basta uma festa com fantasias, música alta, desfile, bebedeira, acesso fácil a drogas recreativas… para que te abandonem em prol dos prazeres do mundo?

- Não creio que acontecerá isso. E ainda me garanto em relação a mais uma coisa: além de não sucumbirem aos prazeres da festa, meus servos ainda vão conseguir converter e tirar muitos foliões da sua festa, Satanás.

Acho que Caetano Veloso tinha razão quando profetizou: “o Carnaval é invenção do diabo. Que Deus abençoou”.

Porém, não me perguntem quem está ganhando essa aposta.

RoniPereira
Enviado por RoniPereira em 11/02/2024
Reeditado em 11/02/2024
Código do texto: T7996886
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2024. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.