Crônicas da rua de São Paulo - O SAMU e o homem deixado na sarjeta
Crônicas da rua de São Paulo
O SAMU e o homem deixado na sarjeta
Há muitas coisas erradas e incompreensíveis na nossa sociedade e no nosso país.
Hoje vi algo que jamais pensei ver em toda a minha vida. Na cidade mais rica do país, num dos locais mais próximos de instituições de saúde de referência da América do Sul, quiçá do mundo, vi algo inacreditável.
Uma ambulância do SAMU (...) parou na rua D. Veridiana, em frente ao metrô e próximo à Igreja de Santa Cecília, tirou a maca com um homem com o pé engessado, o demoveu da maca, o deixou deitado na calçada, o enfermeiro com uma planilha anotou alguma coisa, deixou o homem lá e foi embora.
Vou continuar escrevendo sobre isso. Porém, agora não tenho nem mais opinião. Há tantas instituições que sustentamos com nosso sangue, suor, energia, lágrimas e muito trabalho, desde as instâncias federais, estaduais, municipais e organizações da sociedade civil e, no momento que uma pessoa em estado de necessidade de cuidados médicos necessita do cuidado de uma delas, uma ambulância do SAMU, que foi instituída para levar as pessoas para locais de cuidados médicos, faz o caminho inverso, retira a pessoa de uma casa de cuidados médicos para deixá-la estendida, sem poder andar, na rua, deitada na calçada. E o homem estava com um semblante de horror, de desespero, de desamparo.
Até agora eu não soube o que fazer, tive que desabafar, meu coração safenado não aguentou. Porém, nesse exercício de comunicar esse fato, estou tendo ideias de como ajudar meu irmão da minha espécie, do meu país, de um tipo caboclo, com traços fortes de ascendência indígena, a qual me constitui também e além de uma pessoa, é um ser vivo e ser vivo temos que amparar, sejamos humanos, animais ou vegetais. Não podemos deixar sofrer nem uma pequena planta.
Agora depois do pranteamento e de me dar conta de que somos cruéis por demais e está insuportável tudo isso, vou mandar solicitações para órgãos públicos ou da sociedade civil para amparar o homem. Não sei se conseguirei isso, mas vou buscar. Não é possível conviver no mesmo espaço tanta riqueza, tanta miséria e tanta produção de miséria que implica em produção de outro lado de imensa riqueza.
Ser escrevinhador é, à moda de Voltaire, agir com sua escrita para tornar o mundo mais humano e combater injustiças inaceitáveis.
Rodison Roberto Santos
São Paulo, 25 de julho de 2022